Empresas envolvidas em aquisições de ativos precisam avaliar se a operação deve ou não ser notificada ao Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). Decisões recentes proferidas pelo órgão trouxeram orientações bastante úteis para fazer essa avaliação, que nem sempre é trivial, diante da redação da Lei de Defesa da Concorrência (Lei nº 12.529/2011) e da inexistência de regulamentação específica.

A Lei de Defesa da Concorrência aprimorou o sistema de análise de operações entre empresas pelo Cade, inclusive por elencar as hipóteses que configuram concentração econômica, como a aquisição de ações ou ativos e a celebração de joint ventures, consórcios ou contratos associativos.

Para dar maior segurança jurídica às empresas, o Cade publicou as Resoluções nº 2/2012 e nº 17/2016, que esclarecem, respectivamente, em que situações devem ser notificadas as aquisições de participações societárias minoritárias e os contratos associativos.

Contudo, o Cade não regulamentou até o momento o alcance da norma legal sobre aquisição de ativos (artigo 90, II, da Lei de Defesa da Concorrência), segundo a qual há um ato de concentração quando uma empresa adquire, direta ou indiretamente, por compra ou permuta de ativos, tangíveis ou intangíveis, por via contratual ou por qualquer outro meio ou forma, o controle ou partes de uma ou outras empresas.

A simples leitura desse dispositivo não permite concluir quando ativos configuram, total ou parcialmente, uma empresa, de modo que sua aquisição constitua um ato de concentração.

Desde a entrada em vigor da Lei de Defesa da Concorrência, mais de 200 atos de concentração referentes a aquisição de ativos das mais variadas naturezas foram submetidos ao crivo do Cade: ativos que compunham uma linha de produção; direitos de propriedade intelectual; direitos minerários; carteira de clientes; torres de comunicação; contratos de concessão para exploração de óleo e gás; bens móveis como veículos, tanques de armazenagem e vaporizadores; imóveis urbanos ou rurais como terrenos, prédios comerciais, pedreiras, armazéns, florestas plantadas etc.

Em quase todos esses casos, o Cade entendeu que a notificação era de fato obrigatória, sem aprofundar minimamente as razões que embasaram tais conclusões.

Contudo, em três precedentes recentes, nos quais as partes sustentaram não haver concentração econômica e pediram o não conhecimento das operações, o Cade forneceu orientações bastante úteis para se avaliar a necessidade de notificar aquisições de ativos.

Em um deles, que tratava da aquisição de um terreno com construção civil sem destinação específica, o Cade expressou o entendimento de que a aquisição de imóvel somente configura concentração quando o imóvel é um ativo produtivo ou um ativo que minimamente tenha relação com a atividade econômica a ser ali desenvolvida. Em uma operação que envolva a aquisição de participação inferior a 5% nos ativos imobiliários quem compõem um shopping center pela empresa que já detinha mais de 51% desses ativos e, além disso, atuava como administradora do empreendimento, o Cade entendeu que a operação poderia ser equiparada a uma aquisição de participação societária, pois o empreendimento se assemelhava a uma sociedade empresária. Assim, o Cade aplicou por analogia a regra da Resolução nº 2/2012, segundo a qual não é obrigatório notificar as aquisições de participação societária realizadas por controlador. Nos dois casos, o Cade concordou com as partes e concluiu que as operações não eram de notificação obrigatória.

No terceiro precedente, o Cade discordou das partes e entendeu que a aquisição de ativos isolados (caminhões) relevantes para a atividade econômica do vendedor, mas que nunca haviam sido utilizados por ele, configurava concentração, porque tais ativos representavam acréscimo de capacidade produtiva do comprador.

Nesses casos, portanto, o Cade indicou quando uma aquisição de ativos deve ser submetida ao seu crivo, desde que as partes satisfaçam o critério legal de faturamento: quando os ativos transferidos forem essenciais às atividades das partes; tiverem minimamente relação com a atividade econômica a ser desenvolvida pelo comprador; ou representarem aquisição ou aumento de capacidade produtiva para o comprador.

Além disso, o órgão indicou que, em alguns casos, é possível equiparar aquisições parciais de ativos com aquisições de participações sociais minoritárias e pautar a análise do dever de notificar pelos dispositivos da resolução específica sobre esse tema.

Na ausência de regulamentação específica ou de volume substancial de precedentes em que a questão tenha sido discutida em profundidade, essas decisões são precedentes importantes e devem ser levadas em consideração em operações de M&A.