A Lei de Defesa da Concorrência prevê que a consumação total ou parcial de atos de concentração antes da aprovação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) – infração conhecida como gun jumping – pode ser punida com multa entre R$ 60 mil e R$ 60 milhões, além de outras sanções não pecuniárias.

Por meio da Resolução 24/19, o Cade estabeleceu a metodologia de cálculo, visando conferir maior previsibilidade na aplicação de multas por gun jumping. Pela resolução, o valor da multa é calculado a partir de uma pena-base de R$ 60 mil, majorada de acordo com o decurso do prazo entre a consumação e a notificação ao Cade, a gravidade da conduta e a chamada intencionalidade das partes.

Existe a possibilidade de a multa ser reduzida, dependendo do momento da notificação da operação em relação à instauração de uma investigação e à condenação pela violação ao regime de análise prévia de atos de concentração.

Passados três anos de vigência da resolução, o Cade aplicou multas por gun jumping em seis ocasiões, nas quais houve importantes avanços sobre o tema, principalmente no que se refere à interpretação do órgão sobre o critério de intencionalidade das partes ao cometer a infração – pelo qual a multa pode ser majorada em até 0,4% do faturamento médio dos grupos econômicos envolvidos na operação.

O Cade já aplicou a alíquota máxima para o critério de intencionalidade em operação notificada e consumada deliberadamente pelas partes antes da aprovação.

Entretanto, em um caso em que as partes da operação sabiam que cometeriam a infração, mas o fizeram por contingências de uma recuperação judicial, a alíquota aplicada foi consideravelmente menor (0,02%). O caso mostra que razões legítimas externas à vontade das partes que exijam a consumação antecipada podem mitigar o grau de intencionalidade dos infratores.

A alíquota de intencionalidade tem sido aplicada mesmo quando a infração é cometida de forma não intencional e de boa-fé. A menor alíquota adotada desde a edição da referida resolução (0,001%) decorreu de situação em que os advogados das partes avaliaram, erroneamente, que a notificação ao Cade não seria obrigatória.

Em outro caso, em que a infração resultou de um equívoco sobre os parâmetros contábeis utilizados para fins de cálculo de faturamento e determinação da necessidade de notificação ao Cade, a alíquota foi definida em 0,01%, sob o argumento de que as partes não agiram com a diligência mínima esperada pela autoridade, ainda que de boa fé.

Houve ainda uma operação em que as partes alegaram o desconhecimento da lei e adotou-se a alíquota de 0,04%, superando, inclusive, o grau de intencionalidade da infração em que a consumação foi consciente, porém por motivos contingenciais.

Esses precedentes demonstram que a intencionalidade considerada na dosimetria da multa por gun jumping não se limita ao ato deliberado de violar a lei, pois o Cade identificou sua existência mesmo quando as empresas agiram sem má-fé, mas não adotaram cautelas adequadas para avaliar a necessidade de submeter uma operação à aprovação do conselho.