No julgamento do Recurso Especial 1.738.657/DF, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a seguradora não tem o dever de prestar contas em decorrência de contratos de seguro de vida e seguro-saúde.

A Corte considerou que ação de exigir contas pressupõe a existência de dois elementos:

  • a guarda ou a administração de valores, bens ou interesses por terceiros; e
  • a necessidade de esclarecimentos sobre essa administração, diante de incertezas sobre o saldo resultante do vínculo entre as partes.

O relator do recurso, ministro Moura Ribeiro, entendeu que essa premissa fática essencial também se aplica aos contratos de seguro-saúde e seguro de vida, no sentido de que não há interesse do segurado de exigir contas, pois não há uma relação de guarda ou administração de bens ou interesses de terceiros pela seguradora.

De acordo com o artigo 757 do Código Civil, o contrato de seguro não estabelece a obrigação da seguradora pela gestão de patrimônio alheio, mas tão somente a de “garantir o interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados”, em razão do pagamento do prêmio.

Dessa forma, a obrigação da seguradora seria apenas de pagar a indenização ao segurado, quando da ocorrência do sinistro, conforme valor previamente fixado na apólice, inexistindo qualquer dever de prestar contas.

Para o STJ, nos contratos de seguro de vida e de saúde, “o valor de indenização a ser recebido na hipótese de ocorrência do evento segurado é estabelecido previamente no contrato e, por isso, não há a ‘guarda’ dos valores produtos da arrecadação, ou seja, dos prêmios”.

Há, portanto, uma distinção entre a obrigação de dar e receber e a específica de exigir e prestar contas, o que evidencia a impropriedade da ação de exigir contas lastreada em contrato de seguro. No caso, a obrigação principal da seguradora é pagar a indenização em razão da ocorrência de um dos eventos prefixados na apólice.

A conclusão é que não cabe ação de exigir contas lastreada em contrato de seguro, quando não se verifica situação de administração de bens, nem há complexas operações de débito e crédito vinculadas ao contrato.

Para a Corte, a pretensão de eventual esclarecimento sobre o valor do prêmio em caso de sinistro, por incerteza sobre o montante indenizado em relação às contribuições do segurado, deverá ser realizada pela via ordinária e não por meio do procedimento especial da ação de exigir contas.

Essa decisão, já transitada em julgado, firmou um importante precedente quanto aos meios processuais adequados para esclarecimentos sobre o valor da indenização paga pela seguradora. Também reforçou a natureza jurídica do contrato de seguro e as obrigações assumidas pela seguradora, não admitindo uma interpretação extensiva dos deveres fixados na apólice e previstos em lei.

O precedente também corrobora o entendimento já consolidado da jurisprudência de que a ação de exigir contas é apenas cabível na hipótese em que há administração ou guarda de bens e valores alheios por outrem, tendo o seu titular o legítimo interesse de exigir contas dessa gestão, quando há incerteza sobre o saldo decorrente desse vínculo.

Espera-se que os tribunais passem a observar o posicionamento adotado pelo STJ e afastem a possibilidade de o segurado exigir contas da seguradora, diante da natureza jurídica do contrato de seguro e do fato de as obrigações assumidas pela seguradora estarem fixadas na apólice e previstas em lei. A decisão impossibilita uma interpretação ampliativa e inovadora dos deveres dessas empresas, o que colocaria em xeque a segurança jurídica das relações securitárias.