Economistas e juristas buscam encontrar um método para entender o valor exato de bens ou de serviços em geral. A economia trabalha com fórmulas matemáticas complexas para calcular o valor. No direito, tenta-se usar a analogia com casos paradigmáticos para atingir o mesmo objetivo.

O que nenhum dos métodos conseguiu estabelecer de forma exata até hoje é o valor do sentimento de um fã ou de um torcedor. Apesar das dificuldades que essa tarefa envolve, a tecnologia tem se arriscado nesse trabalho, mesmo que de forma imperfeita.

Na era da disseminação do blockchain e de outras tecnologias de rede distribuída, é possível não apenas mensurar os sentimentos, mas também comercializá-los em formato de tokens. Essa novidade do mercado tem sido apelidada de fan token, que pode significar várias coisas. Fan tokens são ativos digitais baseados na tecnologia blockchain e normalmente comercializados em segmentos de mercado movimentados por sentimentos ligados a torcidas – a paixão por um time, o desejo de vitória etc.

Grandes times de futebol, de basquete e equipes de automobilismo, sobretudo, já emitem seus próprios fan tokens para levantar fundos e criar engajamento entre a marca e seus fãs, torcedores e entusiastas.

Dois tipos de fan tokens são muito comuns no mercado e, até o momento, o cenário jurídico brasileiro tem sido de bastante receptivo.

O primeiro deles se assemelha a uma espécie de carteira de sócio-torcedor, muito similar aos programas de sócio-torcedor difundidos no país na última década. Esse tipo de fan token é uma espécie de utility token e não tem regulação específica. Seu nome decorre justamente das “utilidades” conferidas ao possuidor do ativo.

Por meio da aquisição de fan tokens, uma pessoa pode receber benefícios específicos, proporcionais à quantidade de tokens que obtiver. Por exemplo, direito a voto sobre questões de “baixa governança” da marca, como a escolha da cor da camisa do time ou da figura do mascote. Outro benefício comum é o direito de acesso a assentos preferenciais em partidas disputadas pela equipe ou, ainda, direito a descontos em produtos e serviços oferecidos pela marca.

Um segundo tipo de fan token, menos conhecido, mas não menos interessante, são os chamados tokens de solidariedade. Esses ativos conferem direitos creditórios futuros ao seu possuidor no caso de transferência de clube de um determinado jogador.

Geralmente, o clube que comercializa os direitos do jogador recebe uma porcentagem do valor da transferência com base em um arranjo denominado “mecanismo de solidariedade”. O clube pode se aproveitar desse benefício e emitir e comercializar fan tokens que, em data futura e incerta, darão a seus adquirentes o direito de auferir parcela dos recebíveis. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) chegou a se manifestar em consulta feita pelo Club de Regatas Vasco da Gama sobre o tema e entendeu que fan tokens desse tipo não podem ser considerados valores mobiliários – não estando, portanto, sob sua regulação.

É crescente a possibilidade de que outros tokens que busquem atribuir um valor à paixão e ao afeto por um time venham a ser emitidos e comercializados sob a denominação de fan tokens. Trata-se de um mercado em evolução e, além da movimentação das entidades, é preciso acompanhar os complexos – e criativos – arranjos jurídicos que envolvem essa nova modalidade de ativo.