Entre 2020 e 2021, a disparada na cotação do dólar, atrelada ao aumento da demanda por commodities, desencadeou uma alta significativa no Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M), normalmente utilizado como indexador para correção dos valores dos contratos de locação.

A elevação no IGP-M (que fechou o ano de 2021 com alta de 17,81% e chegou a acumular, em maio do mesmo ano, variação de 37,04% em 12 meses) instaurou uma crise nas relações locatícias e evidenciou um problema: a ausência de um índice que efetivamente reflita as variações dos contratos.

O IGP-M é um índice diretamente afetado pela situação do mercado externo e não guarda qualquer relação com o custo de moradia em seu cálculo. Por essa razão, com o aumento descolado da realidade do país registrado nos anos de 2020 e 2021, locadores e locatários passaram a renegociar a forma de corrigir os valores dos contratos.

Uma das soluções amplamente utilizadas tem sido a substituição do IGP-M pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que é baseado na “inflação de um conjunto de produtos e serviços comercializados no varejo, referentes ao consumo pessoal das famílias” e que, portanto, também não apresenta relação direta com as variações do mercado imobiliário.

Tem-se, então, um cenário instável, já que tanto o IGP-M quanto o IPCA são índices destinados a outros propósitos e não refletem as mudanças reais do mercado imobiliário.

Com a proposta de “preencher uma lacuna nas estatísticas nacionais” no nicho dos contratos de locação, a Fundação Getúlio Vargas (FGV) criou, em 11 de janeiro de 2022, um índice com base de cálculo que considera especificamente as variações locatícias, o Índice de Variação de Aluguéis Residenciais (Ivar). Com periodicidade mensal, o índice faz parte do calendário fixo de índices divulgados e calculados pela instituição.

Para criar o Ivar, a FGV buscou parcerias com empresas administradoras de imóveis, a fim de coletar dados sobre os valores dos contratos novos e dos reajustes dos existentes, além de informações sobre as características de cada imóvel. É importante ressaltar que o Ivar foi concebido, principalmente, com o objetivo de criar um índice baseado em dados de contratos em vigor, e não, por exemplo, em anúncios de ofertas de locação.

Em sua metodologia, o Ivar aplica a média ponderada dos dados obtidos de cerca de dez mil contratos de locação de imóveis residenciais vigentes em quatro capitais brasileiras: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Porto Alegre. A expectativa é que mais cidades sejam agregadas ao cálculo do índice para que ele reflita de maneira mais fidedigna a situação do país.

O índice buscou também acompanhar os avanços desses contratos de locação nos últimos três anos, contemplando tanto as variações extraordinárias, como no período de pandemia, como as variações ordinárias, que comumente decorrem de locações, como o reajuste contratual. Em janeiro de 2021, o índice registrou alta de 1,86%, enquanto em fevereiro de 2021, a variação acumulada em 12 meses foi de 2,92%.

Trata-se de um índice revolucionário, que promete solucionar o principal ponto de conflito nas relações locatícias e garantir maior previsibilidade na relação contratual. Entretanto, entendemos que existe um longo caminho a ser percorrido para que o Ivar seja incorporado pelo mercado imobiliário, principalmente com relação à ampliação dos dados usados para seu cálculo.

Conforme pesquisa realizada em 2018 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil conta com cerca de 12,9 milhões de imóveis alugados para fins residenciais. Uma base composta por dez mil contratos, localizados em quatro capitais, portanto, não é suficiente para consolidar um índice que pretende solucionar um problema das locações em todo o território brasileiro.

Além disso, o Ivar também é limitado quanto à natureza da ocupação do imóvel. O índice busca analisar apenas as variações das locações residenciais e não se aplica aos contratos para fins comerciais. Na verdade, a FGV ainda não tem informações robustas sobre esse segmento de locação. Ressaltamos que não há impedimentos legais para adotar o Ivar também nas relações comerciais, mas, da forma como o índice hoje é composto, ele não refletirá a realidade dessas locações e não será capaz de solucionar a controvérsia existente.

O momento, portanto, é de cautela. Cabe aguardar que o índice esteja consolidado e com dados suficientes para refletir de forma mais completa a realidade imobiliária do Brasil.