O colegiado da Comissão de Valores Mobiliário (CVM) apreciou em abril quatro propostas[1] de termo de compromisso originadas pela não divulgação de ato ou fato relevante e pela negociação com ações de companhia aberta na pendência de divulgação de ato ou fato relevante. Em todos os casos, o colegiado da autarquia acompanhou a recomendação favorável do Comitê de Termo de Compromisso (CTC) à celebração do acordo, com a assunção, pelos proponentes, de obrigações pecuniárias que variaram de R$ 21.132,00 a R$ 597.134,01, de acordo com o caso.

Na negociação das propostas de termo de compromisso, foram levadas em consideração as seguintes circunstâncias na ponderação da obrigação pecuniária a ser assumida por cada proponente em seu respectivo processo:

PROPONENTE TEMA E NORMA INFRINGIDA PARÂMETRO DO DESVIO PROPOSTA INICIAL CIRCUNSTÂNCIAS POSIÇÃO CTC
  • 1.
Insider secundário

Utilização de informações relevantes ainda não divulgadas ao mercado

Infração ao art. 13, da então vigente Instrução CVM 358

Volume negociado:

R$ 205.444,00

R$ 9.221,00

Art. 86 da RCM 45[3]

Bom histórico do proponente

Decisões anteriores do CTC em casos similares

Apresentação da proposta de Termo de Compromisso em momento posterior ao da apresentação de proposta por outros acusados no mesmo processo, o que resultou em trabalho da Administração/CVM que poderia ter sido minimizado

Aprimoramento da proposta para

R$ 21.132,00[4]

  • 2.

DRI

(insider primário)

Suposta negociação com ações pouco antes de divulgação de fato relevante

Infração ao art. 13, da então vigente Instrução CVM 358

Volume negociado:

R$ 302.672

R$ 38.814[5]

Art. 86 da RCM 45[6]

Fase do processo (pré-sancionadora)

Conduta após vigência da Lei 13.506/17, que trata do processo administrativo sancionador na CVM e no Banco Central

Enquadramento da conduta como infração grave, nos termos do Grupo V do Anexo 63 da RCVM 45

Decisões anteriores do CTC em casos similares

Bom histórico do proponente

Aprimoramento da proposta para

R$ 170.000

  • 3.
DRI

Não divulgação de fato relevante diante da ocorrência de oscilação atípica e vazamento de informação referente à negociação até então sigilosa

Infração ao art. 3º c/c 6º, parágrafo único, da então vigente Instrução CVM 358

Variação intraday do ativo:

6,25%

R$ 250.000

Art. 86 da RCM 45

Conduta após vigência da Lei 13.506/17, que trata do processo administrativo sancionador na CVM e no Banco Central

O porte e a dispersão acionária da companhia envolvida

Fase em que se encontra o processo (pré-sancionadora)

Bom histórico do proponente

Decisões anteriores do CTC em casos similares

Aprimoramento da proposta para

R$ 340.000

  • 4.

Presidente do CA

(insider primário)

Negociação de valores mobiliários em período vedado

Infração ao art. 13, da então vigente Instrução CVM 358

Volume negociado:

R$ 887.207

1ª Proposta:

R$ 20.000

2ª Proposta:

R$ 180.000

Art. 86, caput, da então aplicável ICVM 607

Conduta após vigência da Lei 13.506/17, que trata do processo administrativo sancionador na CVM e no Banco Central

Fase em que se encontra o processo

Enquadramento da conduta como infração grave, nos termos do Grupo V do Anexo 63 da RCVM 45

Negociações anteriores do CTC em casos similares

Bom histórico do proponente

R$ 597.134,01[7], atualizado pelo IPCA, desde 11.03.2020, até a data do efetivo pagamento

O instituto do termo de compromisso previsto na RCVM 45 é um método alternativo para o encerramento de processos administrativos na CVM. Pode ser proposto tanto na fase pré-sancionadora quanto após a lavratura do termo de acusação pela área técnica da autarquia que estiver investigando a conduta.

De acordo com o art. 81 da RCVM 45, “a celebração do termo de compromisso não implica confissão quanto à matéria de fato, nem em reconhecimento da ilicitude da conduta analisada”. Por essa razão, não é incomum que esse instituto seja utilizado como estratégia de defesa, uma vez que seu efeito terminativo sobre as demandas administrativas da CVM evita, inclusive, que sejam registrados antecedentes negativos sobre o agente investigado ou acusado.

Apesar da ampla utilização em processos administrativos da autarquia, lançar mão do termo de compromisso como método para encerrar a demanda implica, necessariamente, que seu proponente assuma obrigações, as quais, em geral, são de natureza pecuniária. Eventualmente, pode-se também associar essas obrigações a medidas educativas relacionadas ao mercado de capitais, dependendo da infração investigada. Qualquer que seja o caso, o proponente do termo de compromisso deve se comprometer a encerrar a prática dos atos considerados ilícitos e corrigir as irregularidades, inclusive mediante indenização.

No trâmite das propostas de termo de compromisso, a procuradoria federal especializada opina sobre a existência de impedimento legal à aceitação do termo proposto, o CTC negocia as condições da proposta a ser submetida ao colegiado da CVM e, por fim, os diretores da autarquia analisam, em bases definitivas, se a celebração do termo atende ao objetivo almejado pela legislação aplicável, decidindo sobre a aceitação ou rejeição da proposta.

Conforme descrito no quadro acima, na formulação da proposta do termo e, principalmente, durante a sua negociação com o CTC, são ponderadas as circunstâncias envolvidas no caso para balizar a recomendação do CTC no sentido de aceitar, sugerir aprimoramento ou rejeitar a proposta.

Na ponderação das circunstâncias, o art. 86 da RCVM 45 dispõe que sejam observados “a oportunidade e a conveniência na celebração do compromisso, a natureza e a gravidade das infrações objeto do processo, os antecedentes dos acusados ou investigados ou a colaboração de boa-fé destes, e a efetiva possibilidade de punição, no caso concreto”.

Exceto pelo padrão seguido pelo CTC em negociações anteriores em casos similares – avaliação que depende da conduta sob análise –, as circunstâncias que costumam operar a favor da negociação de obrigações pecuniárias menos gravosas aos proponentes são:

  • bom histórico do proponente, mediante a verificação da inexistência de outros processos ou investigações em curso ou concluídos;
  • apresentação da proposta na fase pré-sancionadora, o que representa economia processual para a administração pública;
  • condutas ocorridas anteriormente à vigência da Lei 13.506/17, que alterou as balizas da atuação sancionadora da CVM;
  • a baixa lesividade da conduta segundo o Anexo 63 da RCVM 45; e
  • o alcance reduzido dos prejuízos gerados pela conduta investigada, entre outras circunstâncias.

Ainda no âmbito da negociação de obrigações pecuniárias, na apreciação das propostas destacadas acima, o CTC recomendou o aprimoramento das propostas iniciais após ter ponderado as circunstâncias do caso. Com isso, visou também estabelecer uma obrigação que seja retributiva para a conduta em análise, de modo a inibir comportamentos similares no futuro.

Nesse sentido, é possível notar que o CTC costuma analisar se a obrigação pecuniária equivale, no mínimo, ao valor do prejuízo causado e/ou vantagem auferida pelo agente. Naqueles casos em que o valor do prejuízo ou da vantagem não é expressivo, o CTC também pode se basear:

  • no percentual de desvio do parâmetro esperado;
  • no volume negociado do ativo; e/ou
  • em múltiplos (geralmente, três vezes) do prejuízo e/ou vantagem auferida.

Alguns dados sobre a celebração de termos de compromisso pela CVM ao longo dos anos podem ser extraídos do Observatório do Mercado de Capitais, iniciativa de mapeamento de dados encabeçada pela Associação Brasileira de Jurimetria, que constatou, por exemplo, nos julgamentos entre 25/01/2000 e 26/03/2019, a existência de 601 casos com propostas de termos de compromisso, dos quais 351 foram celebrados ainda que parcialmente.

Desse total, por sua vez, mais de 90% resultaram na assunção de obrigações pecuniárias. Além disso, temas informacionais em geral lideram o ranking de matérias de termos de compromisso, aparecendo em mais de 70% dos casos.[8]

Para os casos aqui destacados, cuja matéria versava, em síntese, sobre violações à ICVM 358 (revogada pela RCVM 44), a identificação do agente como insider primário – que obtém a informação privilegiada da origem – ou secundário – que obtém a informação por outros meios, inclusive pela troca de informações com o insider primário – foi ponderada para se negociar as obrigações pecuniárias assumidas.

Conclui-se que, para negociar uma proposta de termo de compromisso com o CTC, é necessário ter em vista que a autarquia se baseará em circunstâncias específicas da conduta investigada, como precedentes similares e os elementos próprios da suposta infração (in casu, a categoria de insider), assim como em circunstâncias gerais ponderadas em todos os casos, independentemente da infração, como o histórico do agente, a fase processual, a lesividade da conduta, grandeza e alcance da vantagem e/ou do prejuízo, entre outras.

Considerando a relevância do instrumento e de suas consequências para o processo sancionador, a análise estratégica detalhada da conveniência da apresentação da proposta e um estudo cuidadoso das condições a serem oferecidas são essenciais para garantir maior segurança jurídica e melhores chances de sucesso na aceitação no termo.

 


[1] PAS CVM SEI 19957.0002923/2017-81 (j. 05 de abril de 2022), PA CVM SEI 19957.004542/2020-32 (j. em 05 de abril de 2022), PA CVM SEI 19957.000157/2021-05 (j. em 05 de abril de 2022) e PA SEI 19957.006367/2021-07 (j. em 12 de abril de 2022).

[2] Equivalente à vantagem auferida atualizada pelo IPCA.

[3] Art. 86 - Na deliberação da proposta, o Colegiado deve considerar, dentre outros elementos, a oportunidade e a conveniência na celebração do compromisso, a natureza e a gravidade das infrações objeto do processo, os antecedentes dos acusados ou investigados ou a colaboração de boa-fé destes, e a efetiva possibilidade de punição, no caso concreto.

  • 1º Antes de deliberar sobre a proposta de celebração de termo de compromisso, o Colegiado pode solicitar ao Comitê de Termo de Compromisso a adoção de novas providências de instrução processual. § 2º Quando a proposta for apresentada ainda em fase de apuração ou antes desta, o Colegiado deve considerar a natureza e as circunstâncias da infração a fim de avaliar a conveniência na celebração do termo de compromisso face aos benefícios de eventual celebração de acordo administrativo de supervisão, podendo determinar o sigilo do procedimento até o julgamento do processo administrativo sancionador.

[4] Correspondente ao triplo do lucro bruto auferido com as operações em tese irregulares e majorado em razão de o proponente ter apresentado proposta para celebração de ajuste somente após a Administração já ter se pronunciado sobre propostas de ajuste apresentadas por outros acusados no âmbito do mesmo processo, atualizado pelo IPCA.

[5] Equivalente a três vezes o valor da vantagem auferida pelo proponente segundo a defesa.

[6] Vide nota 3 acima.

[7] Correspondente ao triplo do suposto prejuízo evitado, calculado pela Área Técnica em R$ 212.882,00, considerando: (i) a cotação média do ativo ponderada por volume negociado na data do impacto da informação divulgada; (ii) fator redutor devido à fase em que se encontra o processo; e (iii) fator majorador devido ao retorno do processo ao CTC após anterior deliberação de rejeição do colegiado.

[8] Para mais informações, acesse: Observatório do Mercado de Capitais.