A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) divulgou, em 24 de fevereiro deste ano, o Ofício Circular Anual 2022 CVM/SEP, que consolida as orientações da Superintendência de Relações com Empresas (SEP) a serem observadas por companhias abertas, estrangeiras e incentivadas no cumprimento de suas obrigações regulatórias.

Com o propósito de esclarecer aspectos importantes sobre os procedimentos adotados no dia a dia das companhias e diante das recentes alterações na legislação e na regulamentação em vigor, o ofício circular traz atualizações sobre temas relacionados a:

  • Mudança de regras para as publicações obrigatórias exigidas pela Lei 6.404/76, conforme alterada (Lei das S.A.);
  • Convocação de assembleias gerais;
  • Comprovação de propriedade ininterrupta de ações para eleição em separado de membros do conselho de administração;
  • Notas explicativas e relatório da administração;
  • Preenchimento do formulário de referência;
  • Recolhimento de taxa de fiscalização;
  • Recurso e pagamento de multas cominatórias;
  • Assinatura digital; e
  •  Consultas.

 

Mudança de regras para as publicações obrigatórias

 

Em 1º de janeiro deste ano, entrou em vigor a Lei 13.818/19 que alterou a Lei das S.A. As mudanças dispensam as companhias de realizar as publicações obrigatórias em Diário Oficial e permitem que atos societários e demonstrações financeiras sejam publicados de forma resumida.

Como a exclusão da necessidade de publicação no Diário Oficial se trata de uma mudança de divulgação decorrente de alteração da própria lei, a SEP entende que não é necessário observar o §3º do artigo 289 da Lei das S.A., que determina que qualquer mudança de jornal seja precedida de aviso aos acionistas no extrato da ata da assembleia geral ordinária. Basta que as companhias atualizem seu formulário cadastral e divulguem um aviso aos acionistas para comunicar a decisão.

Em relação às publicações resumidas, ressaltamos que as demonstrações financeiras têm um conteúdo mínimo determinado no inciso II do artigo 289 da Lei das S.A. Além disso, é importante que as companhias observem o Parecer de Orientação CVM 39, de 20 de dezembro de 2021, que detalha o conteúdo mínimo das demonstrações financeiras resumidas e indica os alertas que devem constar da publicação.

No que se refere às demais publicações – como relatório da administração, editais e atas –, não existe um conteúdo mínimo obrigatório. A SEP alerta que as companhias devem ficar atentas para não omitir nem divulgar de maneira incompleta ou imprecisa informações relevantes, de modo a induzir o investidor a erro. As publicações resumidas devem conter um aviso de que as informações prestadas foram resumidas, além de indicar os endereços eletrônicos nos quais os documentos podem ser acessados na íntegra (site de jornal de grande circulação, da CVM e da B3, se a companhia for listada).

Para mais informações sobre as novas regras sobre as publicações ordenadas pela Lei das S.A., inclusive para companhias fechadas, e sobre as orientações do ofício circular a esse respeito, sugerimos a leitura desse artigo publicado no nosso portal Inteligência Jurídica.

 

Convocação de assembleias gerais

 

Apesar de a alteração da Lei das S.A. permitir que as assembleias gerais sejam convocadas com antecedência mínima de 21 dias, em primeira convocação, e em 8 dias, em segunda convocação, a SEP orienta as companhias a continuar adotando os 30 dias de antecedência, a fim de incentivar a participação dos investidores.

Com esse mesmo propósito e em atenção especial aos investidores estrangeiros, a SEP recomendou que os anúncios de convocação destaquem a importância de os pedidos de voto múltiplo serem feitos com antecedência pelos acionistas; recomendou também, em atenção às companhias com participação relevante de investidores estrangeiros, que documentos e informações que venham a servir de subsídio para as assembleias sejam divulgados concomitantemente em português e inglês.

 

Comprovação de propriedade ininterrupta de ações para eleição em separado de membros do conselho de administração

 

Nos termos do artigo 141, §6º, da Lei das S.A., somente poderão exercer o direito de eleger em separado membro do conselho de administração, os acionistas que comprovarem a titularidade ininterrupta da participação acionária exigida durante o período mínimo de três meses que antecederem a realização da assembleia geral.

Embora não seja uma obrigação atribuível ao acionista pela Lei das S.A., a SEP, visando que as companhias estimulem a participação de acionistas nas suas assembleias e não criem formalidades que possam onerar ou dificultar o exercício de direitos pelos acionistas, entende que:

  • a melhor prática é que as companhias incluam no conjunto de serviços prestados pelos agentes escrituradores o controle da verificação da propriedade ininterrupta das ações em relação a todos os itens que envolvem a matéria (requisição da eleição em separado e escolha de candidatos), de forma que o agente escriturador encaminhe ao emissor as informações que incluem a avaliação desse requisito de elegibilidade;
  • no caso de envio de boletim de voto a distância ao escriturador ou custodiante, a exigência de encaminhamento de documentação que comprove a propriedade ininterrupta das ações parece criar uma formalidade dispensável e onerosa ao acionista; e
  • quanto aos boletins de voto enviados diretamente à companhia, respeitando o disposto no artigo 21-F, parágrafo 1º, inciso IV, da Instrução CVM 481, cabe à administração definir procedimentos e formalidades que sejam imprescindíveis à garantia da integridade do processo de votação via boletim de voto –eventuais exigências documentais não devem representar obstáculos desnecessários à participação dos acionistas nas assembleias.

 

Notas explicativas e relatório da administração

 

Nesta versão do ofício circular, a SEP apresentou um estudo sobre exigências formuladas em demonstrações financeiras nos pedidos de registro de companhia aberta. As exigências mais comuns foram as seguintes:

  • divulgação deficiente de políticas contábeis aplicadas à companhia, principalmente quando se verifica que a companhia majoritariamente se deteve em transcrever ou parafrasear as normas contábeis, sem observância do CPC 23 e do OCPC 07;
  • divulgação de informações referentes ao relacionamento com os auditores independentes, de acordo com o previsto no artigo 31 da Instrução CVM 308/99 (atual Resolução CVM 23/21), no relatório de administração;
  • aspectos referentes à perda de valor recuperável de ativos (teste de impairment), nos termos do item 134 do CPC 01 (R1) e orientações do item 3 do Ofício circular/CVM/SNC/SEP/Nº 01/20);
  • divulgação da conciliação de informações de natureza não contábil (Ebitda ou Ebitda ajustado) de acordo com a Instrução CVM 527/12; e impostos sobre o lucro, nos termos previstos pela Instrução CVM 371/02.

A SEP alerta as companhias já registradas e os emissores em processo de registro que se mantenham atentos para divulgar corretamente os itens acima nas notas explicativas de suas demonstrações financeiras e relatório da administração, conforme o caso.

 

Preenchimento do formulário de referência

 

Em relação ao preenchimento do formulário de referência do exercício de 2021, as principais orientações adicionais são:

  • Item 12.6 “e” – Participação de membros do conselho de administração e do conselho fiscal em reuniões realizadas pelo respectivo órgão: neste item, as informações devem se referir às participações dos administradores nas reuniões realizadas após a posse em seus respectivos cargos. Assim, o preenchimento dessa informação deverá ser realizado com base na sua participação nas reuniões ocorridas após a posse referente à sua última eleição.
  • Item 15 – Não é necessária a atualização do formulário de referência em caso de alteração da quantidade de ações em tesouraria decorrente da execução de programa de recompra. Contudo, caso a quantidade de ações adquirida ao longo do programa represente alteração nos patamares de participação acionária de 5%, 10%, 15% e assim sucessivamente, em razão da possibilidade de variação no percentual dos acionistas, recomenda-se que o item 15.1/2 (ações em tesouraria) do formulário de referência seja atualizado.
  • Item 16.2 – Transações com partes relacionadas: a SEP reforçou a necessidade de deixar clara a finalidade das transações com partes relacionadas e o interesse da companhia em mantê-las. Além disso, a área técnica esclareceu que, quanto ao saldo existente das transações com partes relacionadas (letra “g”), o valor informado neste campo deve corresponder ao restante do contrato (a parte que cabe à parte relacionada). O preenchimento do campo “Montante correspondente ao interesse de tal parte relacionada no negócio, se for possível aferir” deve levar em consideração que, geralmente, se o negócio é firmado diretamente com a parte relacionada, o seu interesse no negócio é de 100% do montante envolvido, de modo que se repete esse valor. Em alguns casos, a parte relacionada pode ser “cointeressada” se, por exemplo, for detentora de parte do imóvel alugado. Nesse caso, deve constar apenas o valor relativo ao seu interesse na operação.

Em decorrência da edição da Resolução CVM 59, que entra em vigor no início de 2023, o formulário de referência sofrerá diversas alterações no seu formato e estrutura. Sugerimos, como forma de preparação para o que está por vir, a leitura desse artigo, publicado no nosso portal Inteligência Jurídica.

 

Recolhimento de taxa de fiscalização

 

Outro ponto importante tratado pelo ofício circular diz respeito às taxas de fiscalização da CVM, as quais sofreram alterações com a edição da Medida Provisória 1.072/21.

Em linhas gerais, houve ampliação dos eventos em que a taxa é devida, como por ocasião do pedido de registro inicial de emissor e da realização de ofertas com esforços restritos dispensadas de registro na CVM. A periodicidade do pagamento da taxa para manutenção do registro de emissor que era devida trimestralmente foi alterada, assim como foi excluído o teto limitador da taxa cobrada em relação às ofertas públicas de valores mobiliários.

Abaixo, segue resumo das taxas:

  Taxa para manutenção do registro de emissor Taxa por ocasião do pedido de registro inicial de emissor* Taxa por ocasião da realização de oferta pública de valores mobiliários
  • Valor
De acordo com o patrimônio líquido do emissor em 31 de dezembro do exercício anterior, nos termos do Anexo I da Lei 7.940/89. 25% do valor da taxa para manutenção do registro de emissor, baseada no patrimônio líquido em 31 de dezembro do exercício anterior. Para emissor constituído posteriormente, a taxa deve ser recolhida pelo menor valor previsto na faixa aplicável ao contribuinte, nos termos do Anexo I da Lei 7.940/89.

0,03% sobre o valor total da oferta, incluindo lotes base, adicional e suplementar.

  • OFERTA ICVM 400

Quando houver bookbuilding, recolhimento feito com base na estimativa do valor total considerando oferta base, adicional e suplementar.

  • OFERTA ICVM 476
Incidente sobre o montante efetivamente colocado.
  • Pagamento

(1) Devida até o último dia útil do primeiro decêndio do mês de maio de cada ano; ou

(2) em até 30 dias do deferimento do pedido de registro de emissor.
Antes do protocolo do pedido de registro de emissor.  
  • OFERTA ICVM 400

Antes do protocolo do pedido de registro da oferta em um único pagamento que cubra o valor total da oferta.

  • OFERTA ICVM 476

Quando enviado cada um dos comunicados de encerramento da oferta à CVM.

* Devida apenas quando não houver oferta pública concomitante.

 

Recurso e pagamento de multas cominatórias

 

A Resolução CVM 47/21 determina, em seu artigo 16, que a decisão pela aplicação de multas cominatórias é passível de recurso ao colegiado, por meio do sistema CVMWeb, dentro do prazo de dez dias contados da data do aviso de recebimento do ofício que comunicar a aplicação da multa.

O prazo de vencimento da multa, no entanto, não se altera em função da interposição de recurso, já que este não tem efeito suspensivo. Portanto, caberá à companhia optar por: (i) efetuar o pagamento da multa na data de vencimento e, caso o recurso seja deferido, requerer o ressarcimento à CVM; ou (ii) não efetuar o pagamento e, caso o recurso não seja deferido, efetuar o pagamento da multa acrescida dos encargos em virtude do atraso no seu pagamento.

Sobre esse tópico, a SEP também esclareceu que, como as multas cominatórias não se confundem com as penalidades previstas no caput e incisos I a VIII do artigo 11 da Lei 6.385/76, conforme alterada, não é possível transformar multa cominatória em advertência.

 

Assinatura digital

 

Em linha com o Decreto 10.543/20, o ofício circular também contém orientações a respeito da assinatura eletrônica de documentos que devem ser encaminhados pelo protocolo digital da CVM, os quais deverão ter assinatura avançada ou qualificada (nível prata ou ouro na Plataforma de Cidadania Digital.GOV.BR) nos seguintes casos:

  • solicitação de registro de emissor de valores mobiliários, na categoria A, no âmbito da Deliberação CVM 809/19;
  • interposição de recurso de multa;
  • solicitação de tratamento sigiloso de informações/documentos fornecidos em função de atendimento de exigências feitas no âmbito da Instrução CVM 480/09, conforme alterada (artigo 56, parágrafo 3º);
  • consultas com solicitação de tratamento sigiloso;
  • solicitação de exceção à imediata divulgação de fato relevante (artigo 7º da Resolução CVM 44/21); e
  • a assinatura de termo de compromisso com a CVM.

Para fins de esclarecimento, a assinatura avançada requer do signatário o uso de um certificado digital, mas esse não precisa necessariamente ser emitido pela ICP-Brasil (Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira). A assinatura eletrônica avançada pode ser emitida por outro meio de comprovação da autoria e da integridade de documentos em formato eletrônico, desde que admitido pelas partes como válido ou aceito pela pessoa a quem for oposto o documento, com as seguintes características:

  • estar associada ao signatário de maneira unívoca;
  • utilizar dados para a criação de assinatura eletrônica cujo signatário pode, com elevado nível de confiança, operar sob seu controle exclusivo; e
  • estar relacionada aos dados a ela associados de modo que qualquer modificação posterior seja detectável. Já a assinatura qualificada necessariamente envolve o uso de um certificado digital emitido pelo ICP-Brasil.

Mais informações sobre uso de assinaturas na administração pública federal podem ser encontradas no site da CVM.

 

Consultas

 

A CVM reforça no ofício circular que as consultas de emissores encaminhadas diretamente aos e-mails das gerências ou da SEP somente serão respondidas por e-mail se envolverem assuntos de baixa complexidade, que não necessitem do envolvimento dos gerentes ou do superintendente. As demais consultas devem ser encaminhadas pelo protocolo digital para que haja abertura de um processo administrativo específico sobre o tema.