A Norma Regulamentadora 4 (NR-04) estabelece os parâmetros e requisitos para a constituição e manutenção do Serviços Especializados em Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT). Em 12 de novembro deste ano, entrou em vigor o novo texto da NR-04, alterado pela Portaria 2.318/22, com diversas mudanças em relação à redação anterior.

O novo texto trouxe alterações significativas em aspectos essenciais para a constituição e manutenção do SESMT, tais como competências, composição, modalidades e dimensionamento.

Competências

De forma geral, a nova redação da NR-04 reformulou a redação referente às competências do SESMT, incluindo obrigações e responsabilidades e adequando a atuação do SESMT às novas diretrizes definidas no texto reformulado da NR-01, em vigor desde 3 de janeiro de 2022.

Entre as novas competências do SESMT, as que merecem maior destaque são:

  • elaboração ou participação na elaboração do inventário de riscos;
  • acompanhamento da implementação do plano de ação do Programa de Gerenciamento de Risco – PGR, conforme instituído pela nova NR-01;
  • propositura imediata de interrupção das atividades e adoção de medidas corretivas e/ou de controle quando forem constatadas condições de risco grave e iminente; e
  • acompanhamento e participação nas ações do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional – PCMSO, nos termos da NR-07.

Composição

Não houve alteração na composição do SESMT. Foi mantida a determinação de composição por médico do trabalho, engenheiro de segurança do trabalho, técnico de segurança do trabalho, enfermeiro do trabalho e auxiliar ou técnico em enfermagem do trabalho, conforme aplicável, de acordo com a tabela constante no Anexo II da NR-04.

Entre os médicos do trabalho do SESMT, deve ser nomeado o responsável pelo PCMSO.

Modalidades

O texto antigo definia que os estabelecimentos que não preenchessem individualmente os requisitos previstos no Quadro II da NR-04 poderiam ser atendidos por SESMT comuns organizados por sindicatos ou associações da categoria econômica correspondente ou, ainda, pelas próprias empresas interessadas. Já o novo texto dispõe que os estabelecimentos deverão constituir SESMTs em três possíveis modalidades: individual, regional ou estadual, de acordo com o enquadramento nos parâmetros definidos no Anexo II da nova NR-04.

  • O SESMT será constituído na modalidade individual quando o estabelecimento ao qual prestará atendimento se enquadrar individualmente nos parâmetros do Anexo II da NR-04, sendo, assim, responsável por atender a um único estabelecimento;
  • O SESMT será constituído na modalidade regional quando uma organização possuir um estabelecimento que se enquadre nos parâmetros do Anexo II da NR-04 e outros que não se enquadrem, devendo aquele que se enquadrar estender o atendimento do SESMT constituído aos demais estabelecimentos; e
  • O SESMT será constituído na modalidade regional quando a soma de todos os trabalhadores de diversos estabelecimentos de uma organização localizados em um mesmo estado for suficiente para o enquadramento nos parâmetros do Anexo II da NR-04, sem que esses mesmos estabelecimentos se enquadrem individualmente.

Caso haja mais de um estabelecimento que se enquadre nos parâmetros do Anexo II, a organização poderá constituir mais de um SESMT regionalizado.

Apesar de a NR-04 restringir a atuação do SESMT compartilhado a uma mesma unidade da federação, o subitem 4.4.5. apresenta exceção à regra, prevendo que uma ou mais organizações que desenvolvam a mesma atividade econômica e estejam localizadas em um mesmo município ou em municípios vizinhos, ainda que em diferentes unidades da federação, e cujos estabelecimentos se enquadrem no Anexo II, podem constituir SESMT compartilhado, organizado pelas próprias interessadas ou por meio de acordo ou convenção coletiva de trabalho.

Dessa forma, o novo texto contempla uma diversidade de cenários para a constituição dos SESMT pelas organizações.

Dimensionamento

As regras para dimensionamento do SESMT, por sua vez, sofreram poucas alterações. O novo texto atualizou a redação da NR-04 somente para dar mais clareza às definições apresentadas na norma.

Assim, como sempre foi, o dimensionamento do SESMT deverá ser feito de acordo com o número total de empregados e o maior grau de risco entre a atividade econômica principal e a atividade econômica preponderante no estabelecimento, conforme previsto nos Anexos I e II da NR.

Nesse aspecto, a nova redação traz claramente a definição de atividade econômica principal – aquela indicada pela organização no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), de acordo com a Classificação Nacional de Atividade Econômica (CNAE) – e atividade econômica preponderante no estabelecimento – a que ocupar o maior número de empregados.

Caso haja o mesmo número de empregados dedicados a duas atividades econômicas com graus de risco distintos, a organização deverá considerar a atividade de maior grau de risco para dimensionamento do SESMT. Essa regra também permaneceu inalterada.

O dimensionamento do SESMT também poderá ser impactado pela contratação de trabalhadores prestadores de serviços, os quais poderão ser contabilizados para fins de dimensionamento do SESMT de uma organização, a depender da forma como é estruturado o SESMT da empresa prestadora de serviços.

Organizações que contem com SESMT já constituído e que venham a contratar empregados por prazo determinado, deverão complementar o dimensionamento do SESMT, se necessário, conforme o disposto no Anexo II, durante o período determinado.

Terceirização

Além das novidades mais formais, como as apresentadas acima, um dos pontos mais relevantes da nova redação da NR-4 diz respeito à exclusão da determinação de que os profissionais membros do SESMT sejam contratados diretamente como empregados da organização para a qual atuarão.

Com isso, criou-se o questionamento e, para alguns, a oportunidade para a terceirização dos serviços do SESMT. Não havendo determinação expressa quanto à contratação dos membros do SESMT como empregados, pode-se entender que os serviços do SESMT poderiam ser terceirizados.

Essa linha de pensamento encontra respaldo nos termos da Lei 6.019/74, como alterados por força da Lei 13.467/17, também conhecida como Reforma Trabalhista, a qual autoriza a terceirização de quaisquer atividades, bem como o entendimento manifestado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no Tema 725.

Importante ressaltar que o novo texto não autoriza expressamente a terceirização dos profissionais do SESMT. Ele apenas excluiu a determinação expressa de que devam ser empregados diretamente pela organização.

Tais profissionais, ainda que não precisem ser obrigatoriamente empregados pela organização, devem ser devidamente registrados nos órgãos competentes para o exercício de suas funções. Também devem ser registrados pela organização no Portal Virtual do Governo Federal (portal.gov.br) e, em tal registro, é preciso constar dados relevantes de qualificação e atuação dos profissionais, como:

  • número do CPF;
  • qualificação e número de registro;
  • grau de risco definido para o(s) estabelecimento(s) onde atuarão; e
  • horário de trabalho dos profissionais.

Assim, ainda que não haja previsão expressa sobre a forma de contratação dos empregados, a nova redação da NR-04 determina alguns requisitos para a atuação regular desses profissionais.

Em sentido contrário ao entendimento apresentado acima, o Ministério Público do Trabalho (MPT) emitiu, em 31 de agosto de 2022, a Nota Técnica Conjunta 01/22, elaborada pela Coordenadoria Nacional de Defesa do Meio Ambiente de Trabalho (Codemat) e pela Coordenadoria Nacional de Combate às Irregularidades Trabalhistas na Administração Pública (Conap).

Com essa nota técnica, o MPT pretendeu subsidiar a atuação de seus membros, defendendo a tese de impossibilidade de constituição de SESMT na modalidade de contratação de empresa especializada, ou seja, por meio de terceirização.

Entre os principais argumentos apresentados na nota técnica, o MPT defende que os serviços do SESMT não se confundem com a atividade econômica ou prestação de serviços prevista na Lei 6.019/74, que, portanto, não tem o condão de viabilizar a terceirização desse atendimento, por não ser norma que trata sobre saúde e segurança do trabalho.

O MPT entende ainda que as competências do SESMT são orgânicas da empresa e têm natureza personalíssima, sendo, portanto, intransferíveis, o que, por si só, inviabilizaria a terceirização de tais serviços.

Além disso, retomando as discussões e manifestações ocorridas na 14ª Reunião Ordinária da Comissão Tripartite Permanente Paritária, as quais rejeitaram expressamente a possibilidade de constituição do SESMT mediante contratação de empresa especializada, o MPT defende que tais manifestações devam ser interpretadas como impossibilidade jurídica de terceirização do SESMT, principalmente considerando a ausência de regulamentação técnica adequada e nacionalmente uniforme.

Levando em conta que o intuito da nota técnica conjunta é dar subsídio à atuação dos membros do Ministério Público do Trabalho, é provável que, como entidade defensora dos direitos coletivos, o MPT atue para investigar, corrigir e/ou punir empresas que constituam seus SESMT mediante a contratação de empresa prestadora de serviços especializados, baseando sua atuação no entendimento manifestado na Nota Técnica Conjunta 01/22.

Ademais, não se pode descartar que o Ministério do Trabalho e Previdência, por meio de seus auditores fiscais do trabalho, também atue no sentido de fiscalizar a atuação das empresas no cumprimento das regras para constituição do SESMT, podendo, se entender pela caracterização de prática irregular da empresa, auditar e aplicar multa às organizações.

Como entidades defensoras dos direitos dos trabalhadores, os sindicatos também podem propor a inclusão de cláusula que exija a contratação dos profissionais do SESMT como empregados em acordo ou convenção coletiva de trabalho.

Transição

A Portaria 2.318/22 também traz informações relevantes em relação ao período e a processos de transição e adequação do SESMT pelas empresas. De acordo com o artigo 3º, os graus de risco atribuídos às atividades econômicas constantes da CNAE (v2.0) deverão ser atualizados a cada cinco anos. A primeira atualização deve ser realizada em até dois anos após a data de publicação da portaria.

O prazo para adequação do dimensionamento do SESMT das organizações, em caso de alteração dos graus de risco de suas atividades, será indicado na própria proposta de atualização. Considerando o novo texto da NR-4, os SESMT atualmente mantidos pelas organizações deverão ser redimensionados a partir de 2 de janeiro de 2023.

Como todas as empresas são obrigadas a cumprir as regras de saúde e segurança do trabalho, é de suma importância que elas estejam atentas às alterações normativas e adequem suas práticas para mitigar riscos decorrentes de eventuais irregularidades.