O governo federal publicou em 12 de janeiro deste ano a Medida Provisória 1.160/23 e a Portaria Conjunta PGFN/RFB 1/23, que trazem uma série de propostas para a redução do déficit primário.

O pacote de medidas, chamado de “Litígio Zero”, modifica a tramitação de processos administrativos tributários e institui novos modelos de transação ou parcelamento.

Na mesma data, foi publicada a Medida Provisória 1.159/23, que contém uma disposição específica sobre a base de cálculo das contribuições ao PIS e à Cofins.

Merecem destaque os seguintes pontos:

  • Revogação do art. 19-E da Lei 10.522/02 e reinstituição do voto de qualidade

A Medida Provisória 1.160/23 revogou o art. 19-E da Lei 10.522/02, que estabelecia critério de desempate em favor do contribuinte nos julgamentos de processos tributários no âmbito do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).

Esse artigo foi introduzido no ordenamento em 2020 por ato do Poder Legislativo, no âmbito da conversão da Medida Provisória 899/19 na Lei 13.988/20.

Desde então, as autoridades fiscais vinham tentando reduzir o escopo de aplicação ou mesmo atacar a constitucionalidade do dispositivo, mas sem grandes êxitos. É importante destacar que, no julgamento ainda não concluído das Ações Diretas de Inconstitucionalidades 6.399, 6.403 e 641,  que tratam dessa matéria, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) vêm votando, em sua maioria, pela constitucionalidade do dispositivo.

Com a revogação do art. 19-E da Lei 10.522/02, retoma-se o critério de desempate do §9º do art. 25 do Decreto 70.235/72, qual seja, a prevalência do voto do presidente da turma (“voto de qualidade”). Por disposição regimental, o presidente da turma é sempre um conselheiro da representação da Fazenda Nacional, o que vinha gerando discussões sobre a existência de uma tendência de votação em favor do Fisco, ou seja, para a manutenção das cobranças, especialmente para as grandes teses.

O restabelecimento do voto de qualidade foi anunciado como uma medida que promoveria o aumento da arrecadação fiscal. Entretanto, seu efeito mais provável é o aumento de judicializado das discussões fiscais, com uma corrida ao Judiciário para revisão dos atos administrativos que tenham sido mantidos em julgamentos decididos por voto de qualidade.

A nova sistemática de desempate de julgamento é válida desde já, devendo ser aplicada nas próximas sessões de julgamento do Carf, programadas para fevereiro.

De toda forma, a introdução definitiva do voto de qualidade no ordenamento dependerá da conversão da Medida Provisória 1.160/23 dentro do prazo previsto no art. 62, §3º, da Constituição Federal.

  • Contencioso de baixo valor – acesso ao Carf

A Medida Provisória 1.160/2023 estabeleceu, ainda, uma restrição de acesso às discussões envolvendo valores menores ao Carf. O lançamento fiscal ou a controvérsia tributária que não supere mil salários mínimos deverão ser julgados em última instância pelas Delegacias Regionais de Julgamento.

Na prática, o aumento do limite de alçada servirá como barreira ao Carf, diminuindo, no longo prazo, o estoque de processos administrativos. A medida pode, no entanto, resultar em mais processos no Judiciário.

  • Aumento do limite de alçada para a interposição de recurso de ofício ao Carf

O governo federal também anunciou a alteração do limite de alçada para a interposição de recurso de ofício ao Carf. Esse recurso é interposto pela Fazenda Nacional em face das decisões das Delegacias Regionais de Julgamento que exonerem, total ou parcialmente, créditos tributários.

O novo limite estabelecido pelo Ministério da Fazenda será de R$ 15 milhões. Em termos práticos, as decisões de DRJ que cancelem autuações de até R$ 15 milhões serão definitivas.

  • Programa de Redução de Litigiosidade Fiscal (PRLF) da Procuradoria da Fazenda Nacional

O programa de medidas do governo federal abarcou também novas hipóteses de transações tributárias. A Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 1, de 12 de janeiro de 2023, estabelece condições para transação excepcional na cobrança de débitos federais em discussão no contencioso administrativo fiscal ou já inscritos em dívida ativa da União.

A medida visa reduzir o estoque de processos em tramitação e aumentar a arrecadação mediante a concessão de descontos para pessoas físicas, jurídicas e micro e pequenas empresas.

Para a transação envolvendo pessoas físicas, micro e pequenas empresas, os descontos concedidos poderão reduzir em 40% a 50% o total do débito. A adesão compreenderá débitos de até 60 salários mínimos.

Já a transação envolvendo outras pessoas jurídicas destina-se apenas aos débitos classificados como de baixa recuperabilidade (aferida conforme disposto no Capítulo II da Portaria PGFN 6.757/22),  mas permitirá redução de até 100% nos acréscimos de multa e juros. Ainda, permite-se a utilização de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa para quitar parte do débito.

A portaria entra em vigor em 1º de fevereiro de 2023, e a adesão ao programa pode ser realizada até 31 de março do mesmo ano.

  • Medida Provisória 1.159/23 – exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS

A Medida Provisória 1.159/23 alterou as Leis 10.637/02 e 10.833/03 para confirmar a exclusão dos valores de ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins, conforme decidido pelo STF no julgamento do Recurso Extraordinário 574.706.

A novidade foi a introdução de dispositivo estabelecendo que o ICMS também não comporia a base de cálculo do crédito do PIS e da Cofins na apuração do custo de aquisição.

Especificamente para esse dispositivo, que provoca uma restrição ao direito de crédito, a medida só passará a produzir efeitos a partir do primeiro dia do quarto mês subsequente ao de sua publicação, respeitando a anterioridade nonagesimal.

Continuaremos acompanhando quaisquer outras medidas relacionadas e informaremos seus impactos aos contribuintes.