O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) começou 2023 com novidades e a expectativa de grandes desafios a serem solucionados. O órgão já está sob liderança de um novo presidente, Carlos Higino Ribeiro de Alencar, nomeado em 5 de janeiro. Já no dia 9 ele deu publicidade à Portaria CARF/ME 455, que determinou a suspensão de todas as sessões de julgamentos do Carf para este mês.

No dia 12 de janeiro, foram publicadas diversas medidas com o objetivo de reduzir o déficit fiscal, por meio do aumento da arrecadação e da redução do estoque de processos no Carf. Entre as medidas que impactam diretamente o Carf, está o retorno do voto de qualidade em caso de empate na votação das turmas julgadoras, revogando o artigo 19-E da Lei 10.522/02, que decidia o empate em favor do contribuinte.

Com essas relevantes alterações e, ainda na expectativa da manutenção do nível de debates e decisões no Carf, continuamos a trilogia de artigos sobres os principais temas julgados pelas turmas da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) do Carf em 2022, fazendo a retrospectiva de assuntos debatidos na 2ª Turma da CSRF.

Responsável principalmente pelos julgamentos de processos envolvendo matéria previdenciárias e Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF), a 2ª Turma da CSRF também passou por alterações em sua composição que se refletiram em mudanças de entendimentos consolidados após 2018.

Foram apenas seis reuniões no ano de 2022, em razão do movimento paredista dos auditores fiscais. Porém, essas reuniões foram marcadas por debates que influenciaram diretamente algumas alterações de entendimentos ou mesmo a confirmação de outros já consolidados na 2ª Turma da CSRF.

Quanto às alterações de entendimentos, destaca-se o julgamento favorável ao contribuinte pela não incidência de contribuição previdenciária para pagamentos de Participação nos Lucros e Resultados (PLR) a diretores não empregados (Acórdão 9202-010.354). O entendimento foi pela inexistência de qualquer distinção entre “empregador” e “trabalhador” ao se interpretar a Lei 10.101/00 ou a Lei 8.212/91.

Nos termos da decisão, dar tratamento tributário distinto para a PLR paga a diretores empregados e não empregados poderia ferir o princípio constitucional previsto no artigo 150, III, da Constituição Federal. Esse tema foi julgado a favor do contribuinte em razão da aplicação do artigo 19-E da Lei 10.522/20 (revogado).

Ainda em relação ao pagamento de verbas de PLR, a turma reconheceu – também pela aplicação do artigo 19-E da Lei nº 10.522/20 – que a assinatura do acordo coletivo em data posterior ao exercício que se refere, por si só, não é razão para o afastamento da aplicação da Lei 10.101/00, ou seja, para a descaracterização do acordo e tributação de contribuição previdenciária sobre as verbas (acórdão 9202-010.357). Nesse caso específico, o plano já vinha se repetindo em anos anteriores e isso já indicava a previsibilidade de regras, necessária para a caracterização dos pagamentos para fins de PLR.

Em relação à matéria de bônus de incentivo (contratação e retenção), o entendimento vencedor foi no sentido de que não há incidência de contribuição previdenciária sobre essas verbas, que não teriam natureza remuneratória (Acórdão 9202-1010.457). A turma reconheceu que o pagamento desses bônus representa adimplemento de obrigações cíveis e não cláusulas trabalhistas, outro tema decidido em razão da aplicação do artigo 19-E da Lei 10.522/02.

Em 2023, é possível a revisão da jurisprudência sobre os temas decididos com base na aplicação do antigo artigo 19-E da Lei 10.522/02. Isso ocorre porque, com o retorno do voto de qualidade, a maioria dos conselheiros representantes da Fazenda Nacional tem entendimento contrário à tese vencedora nessas matérias específicas.

Com relação à discussão sobre a tributação de plano de opções de compra de ações oferecidas pela empresa a seus administradores e funcionários (stock options), tema que certamente será retomado em debates futuros na 2ª Turma da CSRF, o posicionamento também foi favorável ao contribuinte (Acórdão 9202-010.506).

Até então, o entendimento prevalente era pela incidência de contribuições previdenciárias sobre essa verba. Alegava-se que as ações seriam ofertadas aos funcionários no contexto de um contrato de trabalho, o que, por si só, já caracterizaria uma forma de remuneração indireta.

Em 2022, após muitos debates, prevaleceu a tese de impossibilidade de incidência de contribuição previdenciária sobre essa verba, uma vez que o pagamento relacionado às stock options é realizado por um terceiro. Entendeu-se que os planos de opções de compra de ações têm caráter mercantil. O valor da ação é pago pelo mercado, portanto, não se confunde com remuneração e sobre ele não deve incidir a contribuição previdenciária.

Nas seis reuniões do ano de 2022, foram mantidos posicionamentos antigos sem qualquer alteração na jurisprudência. Especificamente quanto ao pagamento de bônus de contratação, o chamado hiring bonus, a turma apenas confirmou a jurisprudência de 2021 pela impossibilidade de incidência de contribuição previdenciária (Acórdão 9202-009.762).

Sobre o tema de incorporação de ações, não houve mudança de entendimento. Foi adotado o posicionamento histórico (Acórdão 9202-010.045) de que o acionista da empresa incorporada, ao receber as ações da companhia incorporadora com valorização, terá ganho de capital passível de tributação pelo imposto de renda.

Apesar da alteração da composição da 2ª Turma da CSRF, com o retorno do voto de qualidade em 2023, espera-se a continuidade de decisões sólidas, advindas de ricos debates e cercada de segurança jurídica.

Clique aqui e acesse ao primeiro artigo da trilogia. Em breve, traremos mais atualizações sobre o tema.