A alienação fiduciária de imóveis consolida-se, cada vez mais, como uma das garantias de utilização expressiva nas operações empresariais em geral. Além de caracterizar-se pelo desdobramento da propriedade do imóvel, o que confere maior segurança jurídica à relação obrigacional garantida, a alienação fiduciária de imóvel está atrelada a um mecanismo de execução extrajudicial mais célere e menos oneroso, se comparado a outros tipos de garantia. Ocorre que, durante a estruturação das operações, as empresas, ao eleger essa modalidade de garantia, esbarram na previsão do § 5°, art. 27, da Lei Federal n°. 9.514/1997, o qual prevê que, em caso de execução da garantia, se, no segundo leilão, o maior lance oferecido não atingir o valor da dívida, o credor deverá dar-se por satisfeito, o que significa dizer que a dívida estará extinta em sua totalidade.

Esta previsão está atrelada a um contexto histórico, tendo em vista que, inicialmente, a alienação fiduciária de imóvel foi instituída no ordenamento jurídico brasileiro com o intuito de servir aos financiamentos habitacionais. Entretanto, com o advento da Lei Federal n°. 10.931/2004, que, em seu art. 51, estabeleceu que a propriedade fiduciária imobiliária também pudesse servir como garantia das obrigações em geral, as possibilidades de utilização desta modalidade de garantia foram significativamente ampliadas.

No entanto, a ampliação que permitiu que o mercado empresarial em geral utilizasse a alienação fiduciária de imóvel como garantia não veio acompanhada das adaptações necessárias para distinguir esta utilização da hipótese prevista pelo legislador original, na qual a alienação fiduciária funcionaria como veículo viabilizador da aquisição da casa própria mediante financiamento. Neste sentido, insta salientar que as operações financeiras e societárias são mais sofisticadas e pautadas no equilíbrio econômico-financeiro das partes envolvidas, razão pela qual a possibilidade de o credor perseguir a satisfação plena do seu crédito não deve ser limitada pela lei, sob pena de enriquecimento sem causa do devedor.

Sobre o tema, em 2007, foi apresentado o Projeto de Lei n°. 1.070, cujo objetivo era justamente restringir a aplicação do perdão da dívida contida no § 5° do art. 27 da Lei Federal n°. 9.514/1997 ao mercado de financiamento habitacional. Tal projeto de lei, apesar de não ter prosperado, foi sucedido pelo Projeto de Lei n°. 6.525/2013, apresentado com o mesmo objetivo, o qual, em 27/11/2014, recebeu parecer favorável do relator designado na Comissão de Desenvolvimento Urbano da Câmara dos Deputados. O parecer apresentado pelo relator precisa ser aprovado pela Comissão de Desenvolvimento Urbano e o Projeto de Lei n°. 6.525/2013 será apreciado, ainda, pelas Comissões de Finanças e Tributação e Constituição e Justiça e de Cidadania.

Percebe-se, portanto, que o perdão da dívida contido no referido dispositivo legal funciona, atualmente, como limitador de uma modalidade de garantia que poderia, em razão das suas demais características, fomentar ainda mais a atividade empresarial e os investimentos no país, por tornar mais segura a possibilidade de o credor receber o valor integral da dívida garantida. Diante disto, considerando a clareza da lei, que não restringiu a aplicação desta possibilidade de extinção da dívida, resta evidente a necessidade de reflexão sobre o tema e, sobretudo, revisão legislativa deste aspecto da alienação fiduciária de imóvel em garantia.