Se fosse encarado como um país, o setor de aviação civil internacional registraria o 20º PIB do mundo, mas estaria entre os dez principais poluidores, com mais de 2% das emissões globais dos gases do efeito estufa. É um impacto ambiental significativo e que vem crescendo de forma rápida, com consequências não só para a aceleração das mudanças climáticas, como também para a imagem do setor perante a opinião pública.

Preocupadas em mudar esse cenário, as empresas de aviação civil vêm se movimentando para propor medidas que contribuam para o atingimento das metas estabelecidas no Acordo de Paris, tratado global sobre o clima firmado durante a 21ª Conferência das Partes das Nações Unidas sobre as Mudanças do Clima (COP 21), em 2015.

Aprovado pelas 195 nações que fazem parte da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (na sigla em inglês, UNFCCC), o acordo contém medidas para “manter o aumento da temperatura média global bem abaixo dos 2 °C acima dos níveis pré-industriais”, limite apontado como seguro pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (na sigla em inglês, IPCC) para evitar boa parte das consequências mais indesejadas do aquecimento global.

O acordo só entrou em vigor em novembro de 2016, depois de ratificado por pelo menos 55 países responsáveis por 55% das emissões mundiais de gases de efeito estufa (GEE). O Brasil conclui seu processo de ratificação em 12 de setembro do mesmo ano.

Além de estabelecer compromissos nacionais, o Acordo de Paris provocou uma série de movimentos também entre as empresas privadas. No setor de aviação civil, a Icao (sigla em inglês para Organização da Aviação Civil Internacional), representada por 191 países, lançou o primeiro acordo global buscando reduzir as emissões nesse segmento. Em outubro de 2016, a entidade aprovou o “Esquema de Redução e Compensação de Emissões da Aviação Internacional” (na sigla em inglês, Corsia), por meio da Resolução A 39-3.

A resolução esclarece que, para viabilizar o atingimento das metas de redução de emissão de gases de efeito estufa, foi adotada uma “cesta de medidas de mitigação”, a qual inclui:

  • desenvolvimento de tecnologias e de novos padrões para as aeronaves;
  • melhoria no controle do tráfego aéreo e das operações em solo para economia de combustível; e
  • uso de biocombustíveis.

Dado o crescimento do tráfego aéreo internacional, no entanto, a Icao reconhece que as medidas detalhadas acima não são suficientes para conseguir a redução desejada na emissão de CO2. Para tanto, é necessário implementar mecanismos de mercado e compensação de emissões, exatamente o que o Corsia também proporciona, por meio da compra de créditos de carbono gerados por outros setores e iniciativas.

O esquema foi estruturado em três fases, tendo como referência (ou linha de base) a projeção de emissões para o ano de 2020. A partir desse valor, qualquer aumento verificado de emissões deverá ser compensado.

As duas primeiras fases serão por adesão voluntária dos países e das companhias: uma fase “piloto” entre 2021 e 2023, seguida de uma fase “inicial” entre 2024 e 2026. De 2027 até 2035, “as medidas e metas de redução de emissões valerão para todos os países, com exceção dos menos desenvolvidos, pequenas ilhas em desenvolvimento e países que não atinjam um percentual mínimo de contribuição para as emissões totais do setor”.

Estudo do Instituto de Conservação e Desenvolvimento da Amazônia (Idesam) afirma que “até julho de 2018, 72 países haviam se comprometido a participar voluntariamente do Corsia desde sua fase piloto, o que representa 70% das atividades relacionadas à aviação internacional. O Brasil ainda não aderiu ao acordo e se comprometeu a participar apenas na fase mandatória, a partir de 2027”.

Segundo as regras do mecanismo, os países de origem e de destino do voo precisam aderir ao acordo para que a obrigação de redução e compensação de emissões de voos entre os dois países seja aplicável em qualquer uma das fases do esquema. Caso o Brasil não participe das fases voluntárias entre 2021 e 2026, as companhias aéreas dos outros países ficam desobrigadas de compensar suas emissões nas viagens para o Brasil nesse período – o que tende a atrair a concorrência estrangeira para o país.

A compensação é um instrumento antigo, que começou a ser usado com a aprovação do Protocolo de Quioto, em 1997, e tem agora, portanto, um novo incentivo para ser empregado em larga escala por meio do Corsia.

Esse mecanismo se dá basicamente por meio de compra de créditos de carbono certificados, que podem ser emitidos por diferentes tipos de projeto, como:

  • florestais, que envolvem o replantio de florestas ou medidas para evitar o desmatamento;
  • energéticos, que podem ser relacionados a fontes renováveis de energia ou eficiência energética; e
  • troca de combustíveis não renováveis e com alta emissão de gases de efeito estufa por combustíveis renováveis.

A adesão voluntária do Brasil e das companhias brasileiras ao Corsia produzirá, sem dúvida, benefícios ambientais, por meio do patrocínio a projetos que geram créditos de carbono, além de contribuir para o objetivo central do Acordo de Paris, que é frear o aquecimento global.

É um movimento que pode ter impacto positivo para a imagem das empresas, considerando que a maioria dos passageiros de voos internacionais se preocupa com o aquecimento global e estaria até mesmo disposta a pagar mais por um bilhete aéreo para compensar as emissões do voo.

Um dos incentivos mais atraentes da adesão voluntária das empresas brasileiras ao Corsia, porém, seria o ganho de competitividade que a medida pode proporcionar, uma vez que ela obriga as companhias estrangeiras a fazer o mesmo, incorrendo em custos muitas vezes maiores que as nacionais.