A Lei 14.195, publicada em 26 de agosto deste ano como resultado da conversão da Medida Provisória 1.040/21, promoveu diversas mudanças no Código de Processo Civil (Lei 13.105/15 – CPC). O processo legislativo que resultou na nova lei tem sido objeto de críticas, incluindo a redação original da medida provisória, que reunia temas dos mais diversos e tinha por objetivo principal melhorar o ambiente de negócios no país e a posição ocupada pelo Brasil (124º lugar atualmente) no ranking Doing Business do Banco Mundial.

Em relação às alterações promovidas no CPC, discute-se até mesmo sua inconstitucionalidade, tendo em vista a vedação constitucional ao tratamento de matéria processual via medida provisória[1] e a inclusão de tema que sequer havia sido tratado na medida provisória (citação eletrônica) na redação final da lei.

Sem entrar no mérito das questões sobre técnica legislativa, abordaremos a seguir as mudanças promovidas pela Lei 14.195/21 no CPC.

 

Citação

 

Com o objetivo de modernizar o processo e conferir a ele mais celeridade e dinamismo, o novo CPC já havia aprimorado a citação por meios eletrônicos, ao prever que empresas públicas e privadas, exceto microempresas e empresas de pequeno porte, deveriam manter cadastro nos sistemas de processo para receber citação e intimações, as quais seriam feitas preferencialmente dessa forma.

A nova lei dá um largo passo a mais ao prever que a citação seja feita primeiramente por meio eletrônico, em dois dias úteis contados da decisão que a determinar, para os endereços eletrônicos indicados no banco de dados do Poder Judiciário, conforme regulamentado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Somente caso não haja confirmação do recebimento da citação eletrônica pela parte no prazo de três dias úteis, a citação será realizada pelos meios tradicionais, via correio, oficial de justiça, escrivão (ou chefe de secretaria) ou edital.

Em decorrência desse novo conceito, que privilegia a citação digital, o CPC passa a conter as seguintes previsões:

  • Dever das partes (art. 77). As partes têm a obrigação de manter seus dados cadastrais perante os órgãos do Poder Judiciário para o recebimento de citações e intimações eletrônicas.
  • Mandado de citação eletrônico (art. 246, § 4º). O mandado de citação por meio eletrônico deve conter orientações para confirmação de recebimento e código identificador para permitir sua correta identificação na página eletrônica do órgão citante.
  • Contagem de prazo (art. 231). O dia inicial da contagem do prazo passa a ser o quinto dia útil seguinte à confirmação do recebimento da citação realizada por meio eletrônico.
  • Justa causa (art. 246, §§ 1°-B e 1°-C). O réu que não tiver confirmado o recebimento da citação eletrônica deverá, na primeira oportunidade em que se manifestar nos autos, apresentar justificativa para tanto, sob pena de multa por ato atentatório à dignidade da Justiça no montante de até 5% do valor da causa.
  • Microempresas e empresas de pequeno porte (art. 246, §§ 1°, 5º e 6º). Como regra geral, todas as empresas, públicas ou privadas, passam a ser obrigadas a manter cadastro nos sistemas de processo em autos eletrônicos. As microempresas e empresas de pequeno porte somente deverão manter tal cadastro caso não tenham endereço eletrônico informado na Redesim – Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios. Dessa forma, os dados de cadastro da Redesim deverão ser compartilhados com os órgãos do Poder Judiciário.

Em nosso entendimento, se, de um lado, a citação por meio eletrônico parece ser um grande avanço para conferir mais celeridade ao processo e reduzir custos, de outro, é preciso refletir se o aparato judiciário está suficientemente equipado para armazenar com segurança e permitir o manuseio dos dados cadastrais de tantas partes e procuradores.

Além disso, como a lei faz menção à regulamentação do CNJ, é importante ressaltar a divergência doutrinária sobre a existência – ou não - de regulamentação suficiente do CNJ nesse sentido. Questiona-se, portanto, se as disposições entram em vigor imediatamente ou se estão condicionadas à existência de regulamentação específica.

 

Exibição de documentos

 

A ação de exibição de documentos é usada para forçar uma das partes, ou um terceiro, a exibir documento ou coisa que se encontra em seu poder.

Para tanto, nos termos do CPC, a parte interessada deveria individualizar o documento ou coisa, demonstrar a finalidade da prova e indicar as circunstâncias em que se funda para afirmar que o documento existe e se encontra em poder da parte contrária ou do terceiro.

A nova lei altera os incisos do art. 397 para passar a prever a exibição de categorias de documentos ou coisas buscadas, além da possibilidade já existente de exibição de documento ou coisa.

A nosso ver, a menção a categorias de coisas ou documentos amplia o objeto da ação de exibição de documentos, conferindo maior subjetividade aos pedidos formulados no âmbito da ação.

 

Suspensão e prescrição intercorrente no processo de execução e cumprimento de sentença

 

Antes da mudança promovida pela Lei 14.195/21, o art. 921 do CPC previa a suspensão da execução por um ano, caso o executado não possuísse bens penhoráveis. Decorrido o período sem manifestação do exequente, teria início o prazo da prescrição intercorrente.

Com a nova lei, passou a constar como hipótese de suspensão da execução a não localização tanto de bens penhoráveis quanto do próprio executado. Manteve-se a suspensão da execução pelo prazo de um ano, mas o termo inicial da prescrição intercorrente passou a ser a ciência da primeira tentativa de localização do devedor ou de bens penhoráveis.

Além disso, a lei alterou o CPC para prever a suspensão da prescrição por uma única vez e pelo prazo máximo de um ano. A mudança do marco inicial da prescrição intercorrente reduziu o prazo do processo de execução em aparente prejuízo ao credor, que passa a arcar com o ônus de ser minucioso na indicação dos bens para satisfação do seu crédito. A reforma parece ter sido motivada para encerrar e reduzir o grande número de processos de execução em trâmite sem sucesso por muitos anos perante o Judiciário.

 


[1] Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.

  • 1º É vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria:

I - relativa a:

(...)

b) direito penal, processual penal e processual civil;