As transações internacionais – sobretudo as realizadas em massa através do comércio eletrônico – e a interação de brasileiros com estrangeiros se dão, atualmente, com facilidade muito semelhante às transações e interações com nacionais. Como consequência, as controvérsias advindas desses negócios e interações surgem em velocidade nunca antes observada.

O número de litígios internacionais, isto é, àqueles que envolvem pessoas físicas ou jurídicas oriundas de diferentes países e/ou obrigações contraídas ou exequíveis no exterior, cresceram não apenas em número, mas também em complexidade. Assim, o avanço da globalização ressalta a necessidade de modernizar as regras processuais no Brasil que regem conflitos internacionais.

Até a entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil (NCPC), em março de 2016, os litígios internacionais eram disciplinados pela Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB (Decreto-Lei nº 4.657/1942) e pelo antigo Código de Processo Civil, de 1973. Tais normas, no entanto, não continham respostas para todas as situações, e as decisões judiciais sobre o tema eram, em parte, contraditórias, o que contribuiu para criar um ambiente de insegurança jurídica para partes estrangeiras fazendo negócios no Brasil.

Para acompanhar a evolução nos litígios transnacionais, o NCPC trouxe algumas inovações que, conquanto tardias, ajudam a sistematizar e consolidar normas e entendimentos jurisprudenciais esparsos nessa matéria. Entre as inovações trazidas, uma das mais relevantes diz respeito ao reconhecimento expresso da possibilidade de eleição de foro estrangeiro em relações contratuais envolvendo partes brasileiras, isto é, a escolha do Judiciário que julgará qualquer controvérsia decorrente do contrato.

A determinação do Judiciário que apreciará litígios surgidos no âmbito de um contrato internacional é certamente um dos temas mais controversos do Direito Processual Internacional. Historicamente, tribunais brasileiros foram reticentes em aceitar que as partes de um contrato, no exercício de sua autonomia privada, afastem a jurisdição brasileira, em benefício de uma jurisdição estrangeira.

A prevalência da vontade das partes na eleição de foro estrangeiro foi, por décadas, entendida pela jurisprudência como uma ofensa à soberania do Estado brasileiro, entendimento esse que, felizmente, caiu por terra com a edição do NCPC.

O legislador do NCPC previu expressamente a possibilidade de eleição de foro estrangeiro em contratos internacionais no artigo 25, cuja redação é clara ao dispor que “não compete à autoridade judiciária brasileira o processamento e o julgamento da ação quando houver cláusula de eleição de foro exclusivo estrangeiro em contrato internacional, arguida pelo réu na contestação”.

Em outras palavras, a partir da entrada em vigor do NCPC, a existência de cláusula de eleição de foro estrangeiro poderá ser arguida pelo réu em sede de contestação, para sustentar a extinção do processo sem resolução do mérito por ausência de competência do Poder Judiciário brasileiro.

Esse dispositivo não se aplica, no entanto, para os casos em que a lei estabelece a jurisdição exclusiva do Judiciário brasileiro: ações envolvendo (i) imóveis no Brasil; e (ii) sucessão ou partilha (decorrente de divórcio, separação ou dissolução de união estável) em relação a bens situados no Brasil.

Cabe ressaltar, por fim, que a inovação acabou também com importante incoerência do Código de Processo Civil de 1973, que, ao mesmo tempo que previa a extinção do processo sem julgamento do mérito no caso de arguição de convenção de arbitragem (art. 267, VII) por qualquer das partes, nada dispunha acerca da extinção do processo por arguição de cláusula de eleição de foro estrangeiro.

Assim, a inovação trazida pelo NCPC supriu uma importante lacuna na legislação, aproximando o Direito Processual Internacional brasileiro das tendências internacionais e, por conseguinte, tornando o ambiente de negócios brasileiro juridicamente mais seguro para o investidor estrangeiro.