A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) afetou o julgamento do Recurso Especial nº 1.797.924/MT à Segunda Seção do tribunal em 10 de outubro. A discussão gira em torno do prosseguimento de ações e execuções ajuizadas contra terceiros devedores solidários, quando a supressão das garantias dos credores está prevista no plano de recuperação judicial.

O julgamento na Segunda Seção teve início no último dia 23 de outubro, quando a ministra Nancy Andrighi votou pelo desprovimento do recurso, concluindo que a supressão de garantias somente poderá ser admitida na hipótese de os titulares terem aderido à cláusula, com manifestação nesse sentido em assembleia.

Segundo a ministra, devem ser conservados intactos os direitos, privilégios e garantias dos que não anuírem com a sua supressão, uma vez que há norma expressa nesse sentido. Assim, no confronto entre o disposto no plano e o expresso em lei, deverá prevalecer o disposto em lei. Como houve pedido de vista do ministro Luis Felipe Salomão, o julgamento foi suspenso e aguarda-se pacificação do entendimento sobre o tema.

O artigo 49, § 1º, da Lei nº 11.101/05 prevê, expressamente, que os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso. Além disso, o caput do artigo 59 faz a ressalva expressa de que a novação dos créditos operada pela aprovação do plano, embora obrigue a todos os credores a ele sujeitos, não extingue as garantias.

Assim, considerando o disposto nos dois artigos, é possível entender que a suspensão prevista nos artigos 6º, caput, e 52, III, da Lei nº 11.101/05, e a novação prevista no artigo 59, caput, da mesma lei não se aplicam aos garantidores e eventuais coobrigados.

Esse foi o entendimento do STJ no julgamento do Recurso Especial nº 1.333.349/SP, ao consignar que “a recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das execuções nem induz suspensão ou extinção de ações ajuizadas contra terceiros devedores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fidejussória, pois não se lhes aplicam a suspensão prevista nos arts. 6º, caput, e 52, inciso III, ou a novação a que se refere o art. 59, caput, por força do que dispõe o art. 49, § 1º, todos da Lei nº 11.101/2005".

Na mesma linha, o Conselho da Justiça Federal aprovou o Enunciado nº 43, na I Jornada de Direito Comercial, segundo o qual “a suspensão das ações e execuções previstas no art. 6º da Lei nº 11.101/2005 não se estende aos coobrigados do devedor”. 

Embora o assunto pareça já estar pacificado pela jurisprudência, em setembro de 2016, no julgamento do Recurso Especial nº 1.532.943/MT, a Terceira Turma do STJ reconheceu, por votação não unânime, que o plano de recuperação judicial que prevê a supressão ou substituição de garantias vincula todos os credores, incluindo os ausentes e os que votaram contra a aprovação do plano, desde que aprovada pela maioria dos credores, ou seja, a votação por maioria na assembleia geral de credores teria o condão de suprimir garantias.

O julgado ganhou relevância, na medida em que foi contrário ao entendimento antes predominante de que as garantias são preservadas, embora o plano de recuperação opere a novação das dívidas a ele submetidas.

Em abril deste ano, no julgamento do Recurso Especial nº 1.700.487/MT, também por votação não unânime, a Terceira Turma do STJ decidiu novamente que o plano de recuperação aprovado pela maioria dos credores de uma empresa em recuperação judicial poderá suprimir todas as garantias fidejussórias ou reais, mesmo sem a anuência de todos os credores com garantia.

Nesse julgamento, os ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro e Paulo de Tarso Sanseverino defenderam a tese do princípio majoritário, no sentido de que as decisões da assembleia geral devem vincular todos os credores. De outro lado, os ministros Ricardo Villas Bôas Cueva e Nancy Andrighi defenderam a tese de que a novação deve atingir apenas os credores que votaram pela sua aprovação, sem qualquer tipo de ressalva. Assim, a questão ainda não está pacificada, tendo em vista a discordância entre os próprios ministros da Terceira Turma.

Considerando a divergência sobre o prosseguimento das ações e execuções ajuizadas contra terceiros devedores solidários, será necessário aguardar o trâmite do julgamento pela Segunda Seção do STJ para esclarecer definitivamente a interpretação a ser dada e o entendimento predominante no confronto entre a preservação de garantias dos credores e a preservação da empresa.