A Instrução CVM nº 602, editada em 27 de agosto, dispõe sobre a oferta pública de distribuição de contratos de investimento coletivo (CICs) hoteleiros – os conhecidos condo-hotéis. Ela revogou a Deliberação CVM nº 734/2015 (conforme alterada pela Deliberação CVM nº 752/2016), que até então regulamentava a matéria.

Durante a vigência da Deliberação CVM nº 734, os ofertantes deveriam observar o disposto na Instrução CVM nº 400/2003, que dispensava o registro da oferta e o pagamento de quaisquer taxas à CVM. Isso mudou com a Instrução CVM nº 602, que é taxativa ao estipular que “não se aplica às ofertas públicas de distribuição de CIC hoteleiro o disposto na regulamentação específica sobre oferta pública de distribuição de valores mobiliários”. Além disso, passa a ser obrigatório o registro da oferta de condo-hotéis na Superintendência de Registro de Valores Mobiliários (SRE), mediante pedido de registro, que deve ser acompanhado do comprovante de pagamento de taxa de fiscalização da CVM, entre outros documentos.

Merece destaque a alteração na definição de “ofertantes” trazida pela Instrução CVM nº 602. De acordo com a nova instrução, são considerados ofertantes o incorporador e qualquer outra pessoa que realize atos de distribuição pública de CIC hoteleiro. Logo, a operadora do empreendimento hoteleiro não se enquadra mais, via de regra, no conceito de ofertante como acontecia no regramento anterior. Acertadamente, a CVM entendeu que “com efeito, ofertante é aquele que, de fato, realiza esforços de distribuição do CIC hoteleiro”, reconhecendo que “ela [operadora hoteleira], usualmente, não é a responsável pelos esforços de venda dos CIC hoteleiros e, por consequência, não se enquadra no conceito de ofertante”. Mas mesmo sem necessariamente figurar como ofertante, a operadora hoteleira continua obrigada a observar algumas regras relativas à divulgação das informações financeiras do empreendimento e contratação de auditoria independente.

Outras importantes alterações foram (i) a possibilidade de dispensa pelos condôminos, reunidos em assembleia, a partir do terceiro ano após a data da divulgação das demonstrações financeiras anuais auditadas em que se tiver reconhecido, pela primeira vez, receita operacional hoteleira, da obrigação de a operadora hoteleira elaborar e colocar à disposição do público demonstrações financeiras anuais do empreendimento hoteleiro auditadas por auditor independente registrado na CVM, e demonstrações financeiras trimestrais do empreendimento hoteleiro, acompanhadas de relatório de revisão especial, emitido por auditor independente registrado na CVM; e (ii) a desnecessidade de aprovação, pela CVM, do(s) material(is) publicitário(s) a ser(em) utilizado(s) no âmbito da oferta – sem prejuízo da faculdade de o ofertante submeter, uma única vez, tal material para aprovação da autarquia, concomitantemente ao pedido de registro da oferta.

O quadro abaixo compara as principais regras aplicáveis à oferta de CICs hoteleiros, antes e depois da edição da Instrução CVM nº 602:

Matéria Antes da Instrução CVM 602 Depois da Instrução CVM 602
Conceito de “ofertante” “A sociedade administradora do empreendimento hoteleiro em conjunto com a sociedade incorporadora ou, na falta desta, a sociedade responsável pela oferta das partes ideais do condomínio geral.” “A sociedade incorporadora ou qualquer outra pessoa que realize atos de distribuição pública de CIC hoteleiro.”
Conceito de CIC “Conjunto de instrumentos contratuais ofertados publicamente no âmbito de empreendimento hoteleiro.” “Conjunto de instrumentos contratuais ofertados publicamente, que contenha promessa de remuneração vinculada à participação em resultado de empreendimento hoteleiro organizado por meio de condomínio edilício.”
Necessidade de registro da oferta Dispensada, desde que cumpridos os requisitos da Deliberação 734. Necessário o registro na CVM (SRE), com possibilidade de dispensa automática somente nos casos previstos no art. 28 da Instrução CVM 602.
Dispensa do registro da oferta para investidores qualificados Dispensa do registro da oferta pública e do emissor para as ofertas de CIC envolvendo esforços de venda de: (i) unidades imobiliárias autônomas destinadas exclusivamente a investidores que possuam ao menos R$1.000.000,00 de patrimônio ou invistam ao menos R$300.000,00 na oferta; e (ii) partes ideais de condomínios gerais destinadas exclusivamente a investidores qualificados que possuam ao menos R$1.500.000,00 de patrimônio ou invistam ao menos R$1.000.000,00 na oferta. Não há essa diferenciação de dispensa de registro para investidores qualificados ou para investidores que tenham um patrimônio relevante ou façam um investimento na oferta acima de um determinado valor. Ademais, não há mais a diferenciação no tipo de condo-hotel, pois a IN CVM 602 trata apenas de CICs hoteleiros de empreendimentos estruturados sob a modalidade de condomínios edilícios com unidades autônomas individualizadas.
Dispensa da divulgação de demonstrações financeiras auditadas Não havia previsão de possibilidade de dispensa. Pode ser dispensada pelos condôminos reunidos em assembleia, a partir do terceiro ano após a data de divulgação das demonstrações financeiras anuais auditadas em que se tiver reconhecido, pela primeira vez, receita operacional hoteleira.
Prazo para divulgação das demonstrações financeiras anuais auditadas 60 dias contados do encerramento do exercício. 90 dias contados do encerramento do exercício.
Pagamento de taxa Não havia. Necessidade de pagamento da taxa relativa ao registro da emissão.
Necessidade de atualização das declarações da operadora hoteleira e incorporadora Não havia. Necessidade de atualização anual, colocando a respectiva atualização à disposição do público na página do empreendimento hoteleiro.
Prazo da oferta Não havia prazo estipulado na Deliberação 734. No entanto, o prazo constante da Instrução CVM 400 é de 6 meses, contados da data de divulgação do anúncio de início. Prazo máximo de 36 meses contados da data de divulgação do anúncio de início, prorrogável uma única vez por igual período.
Prazo para divulgação do registro do Memorial de Incorporação do Empreendimento Não havia, pois também poderiam haver condo-hotéis estruturados sob a forma de frações ideais de condomínios voluntários. 180 dias após a divulgação do anúncio de início.
Material publicitário Necessidade de aprovação prévia pela CVM. Não é necessária a aprovação pela CVM, porém é facultado ao ofertante submeter à CVM para aprovação, uma única vez, concomitantemente ao pedido de registro da oferta.
Conteúdo do prospecto e do estudo de viabilidade econômica do empreendimento hoteleiro O prospecto e o estudo de viabilidade deveriam conter informações mínimas, constantes de anexos da Deliberação 734. Além das informações que já eram necessárias, foram incluídas novas informações obrigatórias que devem constar do prospecto da oferta e do estudo de viabilidade econômica do empreendimento hoteleiro, conforme consta dos Anexos 6-I e 6-II da Instrução CVM 602.
A Instrução CVM nº 602 só é aplicável às ofertas de CICs hoteleiros referentes a unidades autônomas imobiliárias que sejam partes de empreendimentos instituídos sob a forma de condomínios edilícios. As ofertas públicas de condo-hotéis estruturados sob a forma de alienação de frações ideais de condomínios voluntários, que também eram abrangidos pela Deliberação nº 734, deverão observar o disposto na Instrução CVM nº 400. Acreditamos, sem prejuízo, que a CVM poderá acatar a adoção de regimes diferenciados de distribuição para a oferta de CICs hoteleiros envolvendo esforços de venda de frações ideais de condomínios voluntários, nos moldes do que já acontecia com a Deliberação nº 734.

A CVM manteve a necessidade de que o ofertante demonstre que foi assegurado o direito de retratação aos adquirentes de CICs do mesmo empreendimento distribuídos após 18 de abril de 2016, data de publicação da Deliberação CVM nº 752, sem registro ou dispensa de registro da CVM, tendo em vista que tal distribuição é considerada irregular pela autarquia.

A Instrução CVM nº 602 entrou em vigor na data de sua publicação. Suas disposições têm eficácia imediata, observado que, para as ofertas que já tenham sido dispensadas de registro na data de publicação, os ofertantes poderão continuar a seguir as disposições da Deliberação CVM nº 734 e, consequentemente, da Instrução CVM nº 400. Alternativamente, eles podem seguir o regime estabelecido pela nova instrução, inclusive no que diz respeito ao conteúdo e à atualização do prospecto e do estudo de viabilidade econômica e financeira do empreendimento e quanto à possibilidade de dispensa da elaboração de demonstrações financeiras, conforme acima indicado. Para isso, os ofertantes precisarão fazer uma comunicação à CVM no prazo de 60 dias úteis contados da data de entrada em vigor da Instrução CVM nº 602. Para as ofertas que estejam com pedido de dispensa de registro em análise pela autarquia, os ofertantes podem, alternativamente, continuar a seguir as disposições da Deliberação CVM nº 734 e, consequentemente, da Instrução CVM nº 400 ou apresentar novo pedido de registro, observando integralmente a nova instrução.

A Instrução nº 602 finalmente supre uma lacuna regulatória quanto ao tema, que ganhou destaque em 2013 após a suspensão de diversas ofertas pela CVM, e resolve a discussão sobre o enquadramento dos operadores hoteleiros como ofertantes, o que vinha gerando muitas discussões desde a publicação da Deliberação nº 734, em 17 de março de 2015.