O setor de financiamento de projetos de infraestrutura no Brasil passou por mudanças estruturais e estratégicas relevantes nos últimos dois anos. Essas mudanças se pautaram principalmente na redefinição estratégica do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que tem gradualmente se retirado de seu papel centralizador nas operações de financiamento para assumir um perfil mais complementar ao mercado de capitais, com novas condições de financiamento e a adoção da Taxa de Longo Prazo (TLP), substituta da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP).

Esse novo cenário abriu para o setor privado uma janela maior de oportunidade para o financiamento de projetos de infraestrutura por meio do mercado de capitais. No entanto, a substituição do BNDES nas operações de financiamento não ocorrerá de forma automática. Enquanto o setor privado não encontrar uma alternativa de longo prazo, os projetos tendem a sofrer com a falta de financiamento.

Uma alternativa à captação tradicional de recursos via mercado de capitais são os project bonds, já muito conhecidos no mercado exterior. Eles estão geralmente vinculados a um prazo mais longo de vencimento, entre 20 e 30 anos, e a instrumentos mais padronizados, com alta liquidez, fácil circulação entre os investidores e taxas de juros fixas. Com eles, é possível inclusive captar recursos de investidores comuns, embora tradicionalmente os investidores institucionais ainda sejam responsáveis por uma parcela maior dos financiamentos.

Esses títulos de crédito têm como fonte de pagamento as receitas geradas pelos projetos ao quais eles estão atrelados. Eles independem de uma forte prestação de garantias pelos empreendedores e se sustentam tradicionalmente nas garantias geradas pelo próprio empreendimento. Isso confere a eles vantagens significativas em relação às outras formas de financiamento, para isolamento do risco de resultado de um projeto, bem como flexibilidade de colocação no mercado, garantida pelo próprio emissor.

No cenário nacional, o principal instrumento que cumpre esse papel – e o mais alinhado aos exemplos internacionais – são as debêntures de infraestrutura beneficiadas pela Lei nº 12.431/2011.

As debêntures incentivadas são, em essência, a modalidade do mercado local de project bonds, sobressaindo, desde seu estabelecimento, em relação a todos os outros instrumentos ofertados. De forma bastante genérica, as debêntures são emitidas para o financiamento de projetos de infraestrutura de longo prazo e conferem aos investidores benefícios fiscais que tornam mais atraente o investimento em projetos nacionais. No entanto, as debêntures dependem que o ministério setorial competente considere prioritário o projeto candidato a investimento.

O ano de 2018 registrou recordes no financiamento de projetos em infraestrutura fundados nessa espécie de project bonds. No ano anterior, as debêntures incentivadas em infraestrutura já haviam sido um dos investimentos com maior grau de crescimento – mais de R$ 9 bilhões colocados para captação do mercado. Em 2018, foram mais R$ 11 bilhões emitidos em dezesseis operações apenas no primeiro semestre deste ano.

A expectativa é de largo e farto crescimento para o futuro próximo e, apesar de ainda pairarem incertezas do mercado quanto à segurança da política econômica do novo governo, mais de 450 novos projetos já obtiveram autorização por meio de portarias ministeriais para captar recursos no mercado via debêntures incentivadas. Esses projetos somam investimentos na faixa dos R$ 250 milhões, apenas por meio dos project bonds à brasileira.

Mais da metade das debêntures incentivadas emitidas em 2018 estavam vinculadas a novos projetos, o que representa um fortalecimento não apenas do mercado de capitais, mas do setor de infraestrutura como um todo e fomenta, por tabela, o crescimento das outras formas alternativas de financiamento, como ofertas públicas de notas promissórias, fundos imobiliários, letras financeiras e CRIs.

O crescimento em 2018 das emissões de debêntures em infraestrutura, que devem superar até o fim deste semestre mais de três vezes o valor emitido em 2016, foi puxado principalmente pelo empenho do governo federal em fomentar a área, mais especialmente a carteira nos setores de energia (grande carro-chefe), transporte e saneamento básico, e pelas mudanças em políticas estabelecidas desde setembro de 2016. A segurança desses setores, que se tornaram mais estáveis por contar com regulação mais sólida, acaba por torná-los prioritários para os investidores.

Essas medidas geraram um fortalecimento do mercado de capitais, que ocupou o espaço cedido pelo BNDES nos financiamentos a projetos de infraestrutura, em uma tendência muito sustentada pelo interesse dos investidores comuns – especialmente pessoas físicas atraídas pela nova taxa de juros, mais competitiva e salutar para o mercado –, pelos prazos mais longos de retorno desses project bonds e pelos benefícios fiscais. Com o aumento da procura pelo mercado de debêntures incentivadas, o preço para a emissão caiu, o que o deixou ainda mais competitivo.

É visível que o mercado nacional de dívida está se desenvolvendo e se fortalecendo e que nesse processo as debêntures incentivadas em infraestrutura se tornaram o instrumento mais favorável à captação de recursos no setor. Embora em franco crescimento, elas representam pouco mais de um décimo no investimento total em infraestrutura realizado no Brasil. Para ganharem relevância, essas operações ainda precisam passar por aprimoramentos em termos tanto de volume quanto de solidez.