A importância de projetos prioritários no mercado de capitais brasileiro tem crescido exponencialmente nos últimos anos, como apontam os dados referentes às emissões de debêntures incentivadas.

De acordo com o Boletim Informativo de Debêntures Incentivadas de dezembro de 2022 (109ª edição) publicado pelo Ministério da Fazenda, o volume de debêntures incentivadas, ou seja, com direito aos benefícios tributários da Lei 12.431/11, foi de aproximadamente R$ 42,8 bilhões em 2022. Ao longo do mesmo ano, foram publicadas 249 portarias autorizativas aprovando projetos como prioritários,[1] número maior que as portarias autorizativas de 2021 (236) e 2020 (179).

Segundo o boletim, as debêntures incentivadas correspondem a 28,9% do volume total de debêntures negociadas entre o início de 2021 e o fim de 2022. Isso demonstra como é crucial a captação de recursos por debêntures incentivadas no mercado de capitais brasileiro.

Os dados do Boletim de Mercado de Capitais de março de 2023 publicado pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) mostram que o volume total de debêntures do início de janeiro até o fim de março chegou a R$ 36,6 bilhões, divididas em 74 emissões. Desse valor, cerca de R$ 4,4 bilhões são referentes às debêntures incentivadas, divididas em nove emissões.

Nesse contexto, o Decreto 11.498/23 sobre incentivo a projetos prioritários editado no dia 25 de abril – e incluído no novo pacote de 13 medidas de estímulo ao crédito do governo federal – traz mudanças importantes para a área de infraestrutura e o mercado de capitais.

A nova norma é relevante tanto para os setores que tradicionalmente têm projetos considerados prioritários (como logística e transporte, mobilidade urbana, energia, telecomunicações, radiodifusão, saneamento básico e irrigação) como para novas categorias que ela define.

O Decreto 11.498/23 altera o Decreto 8.874/16, que regulamentou a Lei 12.431/11, e estabelece as seguintes medidas:

  • amplia a lista de setores que podem ter projetos de investimento considerados prioritários e, consequentemente, elegíveis aos benefícios tributários da Lei 12.431/11;
  • estabelece novo mecanismo de volume máximo anual para emissão de valores mobiliários para projetos prioritários, conforme determinado por ato do Ministério da Fazenda; e
  • determina que portarias ministeriais que aprovem projetos como prioritários devem informar o valor máximo que poderá ser captado pela emissão de valores mobiliários com benefícios tributários para o projeto aprovado.

Ampliação da lista de setores

O Decreto 11.498/23 aumenta o número de setores que podem ter projetos considerados prioritários. Os novos setores são:

  • educação;
  • saúde;
  • segurança pública e sistema prisional;
  • parques urbanos e unidades de conservação;
  • equipamentos culturais e esportivos; e
  • habitação social e requalificação urbana.

De acordo com o decreto, projetos desenvolvidos nesses setores poderão ser considerados prioritários por proporcionarem benefícios ambientais ou sociais relevantes.

Além dessa possibilidade, pela nova norma, caso projetos desses novos setores e dos setores tradicionais sejam realizados em aglomerados subnormais ou áreas urbanas isoladas – conforme definição do IBGE –, eles também poderão ser considerados projetos que proporcionam benefícios ambientais ou sociais relevantes.

Nesses dois cenários, permanece vigente a necessidade de portaria do ministério competente para aprovar o projeto como prioritário e torná-lo elegível aos incentivos tributários da Lei 12.431/11.

A expansão da lista de projetos que proporcionam benefícios ambientais ou sociais é um passo fundamental para dar mais clareza a esse conceito e aumentar o número de projetos considerados prioritários.

É, portanto, uma medida positiva para o processo de submissão dos projetos. Ao promoverem benefícios ambientais ou sociais já reconhecidos pelo ordenamento jurídico brasileiro, projetos nos setores mencionados acima e/ou projetos localizados em aglomerados subnormais ou áreas urbanas isoladas devem ser enquadrados como prioritários pelo ministério competente.

No caso de projetos dos novos setores, o valor que poderá ser captado pela emissão de valores mobiliários com incentivos fiscais está limitado à despesa de capital calculada para o projeto, com exceção das despesas financeiras. Ainda em relação a projetos dos novos setores, os benefícios da Lei 12.431/11 serão aplicáveis aos papéis emitidos a partir do início de 2024.

Volume máximo anual captado por emissões de valores mobiliários com benefícios fiscais

A Lei 12.431/11 define que projetos considerados prioritários receberão grandes incentivos tributários no caso de emissão de debêntures incentivadas ou certificados incentivados. Os incentivos são:

  • redução para 0% da alíquota do Imposto sobre a Renda das Pessoas Físicas; e
  • redução para 15% da alíquota do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas.

Não existia forma de controle direto sobre o volume total que poderia ser captado por meio das emissões de valores mobiliários com esses incentivos tributários. O Decreto 11.498/23 estabelece que o ministro da Fazenda poderá definir, por meio de portaria ministerial, o volume anual total que poderá ser captado por emissão de valores mobiliários com incentivos tributários. O volume pode, inclusive, ser discriminado por setores.

Embora ainda não haja nenhuma portaria publicada nesse sentido, pelo texto do Decreto 11.498/23, ao se atingir o volume anual total de emissões, não poderão ser mais emitidos valores mobiliários com incentivos fiscais no geral ou para determinado(s) setor(es), até que:

  • a portaria em questão não produza mais efeitos – o que ocorreria anualmente; ou
  • nova portaria amplie o volume anual total de emissões para o ano em questão.

Como o Decreto 11.498/23 já está em vigor, ainda em 2023 poderá ser publicada portaria do Ministério da Fazenda estipulando o volume anual total de emissões com incentivos tributários.

Valor máximo captado pela emissão de valores mobiliários

Como já explicado, para que um projeto possa gozar dos benefícios da Lei 12.431/11, é necessário que ele seja reconhecido e aprovado como prioritário por meio de portaria ministerial. Isso terá que ser feito pelo ministério competente em relação ao setor que propõe o projeto.

Além dos requisitos já mencionados, o Decreto 11.498/23 define que o valor máximo a ser captado pela emissão de valores mobiliários com benefícios tributários deve ser definido na própria portaria ministerial que reconhecer o projeto como prioritário.

Esse requisito também já está em vigor e deve ser seguido pelas próximas portarias ministeriais que analisarem a possibilidade de projetos serem ou não considerados prioritários.

Como se viu, as mudanças são relevantes e impactam tanto os setores tradicionais relacionados a projetos prioritários, ao estabelecerem novos requisitos, como os novos setores, que antes não usufruíram dos incentivos da Lei 12.431/11.

Apesar das mudanças, o art. 1º da Lei 12.431/11 não sofreu qualquer impacto. Com isso os incentivos a investimentos estrangeiros no mercado de capitais brasileiro proposto pela lei ainda podem ser utilizados, inclusive em projetos de infraestrutura não abarcados pelo Decreto 8.874/16 – apesar da importante ampliação setorial promovida pelo Decreto 11.498/23.

 


[1] O número de 249 portarias autorizativas engloba todos os projetos aprovados como prioritários em 2022, incluindo projetos que emitiram e que não emitiram debêntures incentivadas.