Passados 12 meses de uma atualização substancial do marco regulatório de dispositivos médicos, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) segue priorizando a revisão ou elaboração de normas relativas a essa categoria de produto. O objetivo é modernizar o ambiente regulatório brasileiro.

Após mais de 20 anos da publicação da norma anterior (RDC Anvisa 185/01), a RDC Anvisa 751/22, em vigor desde 1º de março deste ano, atualizou os requisitos sobre classe de risco, regularização, requisitos de rotulagem e instruções de uso de dispositivos médicos.

De acordo com a nova regra, os dispositivos médicos (antes chamados de produto médico ou correlato), são definidos como qualquer instrumento, aparelho, equipamento, implante, dispositivo para diagnóstico in vitro, software, material ou outro artigo destinado ao uso em seres humanos, para algum dos seguintes propósitos:

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O enquadramento aplicável a cada produto considera 22 regras que avaliam o risco inerente às funcionalidades, finalidades e aos mecanismos de atuação de cada dispositivo. De acordo com o enquadramento, define-se o regime de regularização na Anvisa: submissão de pedido de notificação ou registro.

Os dispositivos médicos dividem-se em duas subcategorias:

  • Dispositivo médico para diagnóstico in vitro: reagentes, calibradores, padrões, controles, coletores de amostra, softwares, instrumentos ou outros artigos para a análise in vitro de amostras derivadas do corpo humano, com o objetivo de fornecer informações para diagnóstico (ou auxílio), monitoramento, compatibilidade, triagem, predisposição, prognóstico, predição ou determinação do estado fisiológico.

    As atividades com esses produtos é regulada de forma complementar pela RDC Anvisa 36/15.
  • Software médico (também chamado de Software as a Medical Device ou SaMD): é o produto ou aplicação destinado a uma ou mais finalidades indicadas na definição de dispositivo médico e desempenha suas funções sem ser parte de um hardware. Tem como possíveis características:
    • ser executado em uma plataforma computacional de propósito geral (finalidade não médica); e
    • ser usado em combinação (por exemplo, como módulo) ou interação com outros produtos.

Os softwares médicos também estão sujeitos à regulamentação específica – a RDC Anvisa 657/22, que dispõe sobre processos, documentos e informações necessárias para regularização desses produtos.

Mais recentemente, a Anvisa aprovou a primeira alteração na RDC Anvisa 751/22 para regulamentar as situações em que seria admitida a importação de produtos com data de fabricação anterior à data da regularização no Brasil.

Além disso, a diretoria colegiada da Anvisa recentemente abriu uma consulta pública sobre aproveitamento de análises realizadas por autoridade reguladora estrangeira equivalente (AREE).

Confira a seguir os detalhes sobre o tema:

  • Convergência regulatória com autoridades estrangeiras

A partir de 11 de setembro, a Anvisa receberá contribuições à Consulta Pública 1.200/23, que pretende regular o procedimento para análise e decisão de petições de registro de dispositivos médicos, por meio do aproveitamento de análises realizadas por AREEs.

As AREEs são definidas como autoridades reguladoras ou entidades internacionais estrangeiras reconhecidas pela Anvisa como sendo de confiança regulatória (regulatory reliance). Na prática, são instituições consideradas capazes de garantir que os produtos autorizados para distribuição foram adequadamente avaliados e atendem aos padrões reconhecidos de qualidade, segurança e eficácia.

As regras gerais para admissão de análise realizada por AREE foram definidas recentemente por meio da RDC Anvisa 741/22.

As regras serão aplicáveis aos dispositivos médicos enquadrados nas classes de risco III e IV, bem como aos dispositivos médicos para diagnóstico in vitro (regulados pela RDC Anvisa 36/15) – exceto quanto tiverem sido autorizados pela AREE por meio de procedimento otimizado de análise.

Os principais pontos da minuta da instrução normativa apresentada na consulta incluem:

  • O requerente do registro deverá apresentar: declaração específica presente na norma; documento de comprovação de registro ou autorização emitida pela autoridade estrangeira; e instruções de uso do produto, além dos demais documentos já requeridos no dossiê.
  • São consideradas AREEs somente as autoridades da Austrália, Canadá, Japão e Estados Unidos.
  • O requerimento de análise otimizado não prioriza a petição. A análise deve ser mantida conforme a ordem cronológica das petições.

A previsão da Anvisa é que a nova regra antecipe a análise de ¼ dos pedidos que estão atualmente na fila.

As contribuições podem ser feitas até 25 de outubro por meio de formulário eletrônico que estará disponível no site da Anvisa a partir de 11 de setembro.

  • Atualização do marco regulatório de dispositivos médicos

A RDC Anvisa 810/23, aprovada em agosto e já em vigor, altera pontualmente a RDC Anvisa 751/22. A nova resolução regulamenta a importação de dispositivos médicos com data de fabricação anterior à data da concessão da regularização no Brasil.

No passado, a Anvisa impunha restrições nesses casos. Entretanto, considerando a ausência de restrição sobre o tema no Regulamento Técnico de Bens e Produtos Importados (RDC Anvisa 81/09), a agência passou a permitir que os produtos fabricados antes do registro ou notificação sejam colocados no mercado brasileiro, desde que cumpram os seguintes requisitos:

  • prazo de cinco anos entre as datas de fabricação e de regularização dos produtos;
  • conformidade com as características da sua regularização sanitária; e
  • apresentação de documento declaratório emitido pelo detentor de notificação ou de registro, atestando o cumprimento dos dois requisitos mencionados acima, além de atestar que o produto foi fabricado conforme as boas práticas de fabricação de dispositivos médicos.
  • Cibersegurança será objeto de regulação específica

No fim de 2022, a Anvisa realizou a Consulta Pública 1.112/22 para discutir os requisitos essenciais de segurança e desempenho aplicáveis aos dispositivos médicos, incluindo de diagnóstico in vitro (IVD).

No momento, a agência está analisando as contribuições recebidas e deve pautar um texto atualizado até o encerramento da agenda regulatória em vigor.

Espera-se que a futura norma atualize os requisitos previstos na RDC Anvisa 56/01 – recentemente substituída pela RDC Anvisa 546/21 durante o processo de “Revisaço”.

É provável que a norma também se alinhe aos princípios e elementos adotados internacionalmente, como: requisitos relacionados à avaliação clínica, à esterilização e contaminação, ao ambiente e condições de uso, às propriedades químicas, físicas e biológicas, à rotulagem, entre outros necessários para garantir a segurança e eficácia das novas tecnologias do mercado regulado.

  • Próximas discussões

A atual Agenda Regulatória 2021-2023 da Anvisa prevê a discussão de outros temas relevantes para a indústria de dispositivos médicos, incluindo:

  • revisão da regulação sobre ensaios clínicos com dispositivos médicos (RDC Anvisa 548/21);
  • elaboração de novo Guia de Especificação da Documentação para o Peticionamento Eletrônico de Dispositivos Médicos; e
  • atualização da norma sobre dispositivos médicos para diagnóstico in vitro (atual RDC Anvisa 36/15).

A prática de Life Sciences & Saúde pode fornecer mais informações sobre produtos regulados pela Anvisa.