Nos últimos anos, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) analisou diversos atos de concentração verticais que tinham o potencial de gerar preocupações concorrenciais em diversos mercados, como saúde suplementar, bancário, meios de pagamento, petroquímico, telecomunicações e varejista.

Em algumas dessas ocasiões, a autarquia exigiu remédios para mitigar as preocupações. No entanto, ao contrário do que ocorre em jurisdições como os Estados Unidos e a União Europeia, no Brasil não há, até o momento, um guia que oriente e sistematize as etapas de análise de operações verticais.

São considerados atos de concentração verticais aqueles que envolvem operações de aquisição de participação societária ou ativos entre duas ou mais empresas que ofertam produtos e/ou serviços em elos distintos de uma mesma cadeia produtiva.

Nos termos da Resolução Cade 33/22, se nenhuma das partes detiver participação superior a 30% em algum dos mercados verticalmente integrados, o ato de concentração será analisado sob o rito sumário. Caso contrário, a análise será mais cuidadosa e longa, sob o rito ordinário.

Essas operações podem ser benéficas à concorrência quando geram eficiências, como eliminação de dupla margem, alinhamento de incentivos econômicos entre as partes, redução de custos de transação, melhor alocação de recursos e otimização do processo produtivo.

Entretanto, elas também podem gerar preocupações relacionadas principalmente à criação de dificuldades para entrada ou expansão de concorrentes da empresa combinada, por meio de estratégias que dificultem o acesso de concorrentes a insumos (como recusa de contratar, discriminação de preços) ou a uma parcela significativa da base de clientes.

Além disso, essas operações poderão gerar risco de distorção da concorrência se a empresa combinada puder ter acesso a informações comercialmente sensíveis de concorrentes que passam a ser fornecedores ou clientes de seus produtos ou serviços.

O Cade retomou recentemente os planos de criar um guia de análise para operações dessa natureza. Para tanto, formou um grupo de trabalho em junho de 2022 e, em janeiro de 2023, iniciou processo para contratação de consultor externo para apoiar na elaboração desse guia.

Essa movimentação acompanha uma tendência internacional de aumento de preocupação com operações verticais e pode ser influenciada por discussões em curso em outras jurisdições.

Nos Estados Unidos, por exemplo, a autoridade concorrencial – a Federal Trade Commission (FTC) – deixou de observar o guia editado em 2020, por entender que ele não refletia da forma mais adequada a realidade do mercado e poderia estar baseado em teorias econômicas questionáveis. Atualmente, estão sendo feitos estudos para a elaboração de um novo guia, que pode vir a abordar tópicos como metodologia de análise para mercados digitais e operações que envolvem aquisição de empresas nascentes e disruptivas (mavericks).

Por ora, diante da ausência de guia para análise de atos de concentração verticais no Brasil, a avaliação de risco desse tipo de operação deve ser pautada por elementos já considerados nos precedentes do Cade, tais como: participação de mercado das empresas nos mercados verticalmente integrados; incentivos e capacidade de dificultar o acesso de concorrentes a insumos ou a parcela significativa de clientes; e acesso a informações que gerem risco de distorção da concorrência.