Escrevemos recentemente sobre a iniciativa do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) de criar um projeto-piloto de conciliação e mediação pré-processuais para disputas empresariais decorrentes dos efeitos da pandemia (Provimento CG nº 11/2020, de 17 de abril). Naquela oportunidade, chamamos a atenção para o fato de a crise de covid-19, apesar de suas consequências dramáticas, estabelecer um contexto propício ao surgimento de novas formas de solução de conflitos pelo Judiciário. Agora observamos a mesma situação nos juizados especiais cíveis, com a criação da “conciliação não presencial” ou conciliação virtual.

Nos juizados especiais, as ações são propostas pelo próprio requerente (ou por meio de advogado, para causas com valor entre 20 e 40 salários mínimos). Em seguida, é designada audiência de tentativa de conciliação, presidida por um conciliador. Havendo acordo, seus termos são sistematizados pelo conciliador e, posteriormente, homologados pelo juiz, para que fiquem as partes vinculadas. Não havendo acordo, o processo segue para uma audiência de instrução presidida por um juiz. Ali, o requerido apresenta sua defesa e as partes podem requerer a oitiva de testemunhas. Finalmente, vem a sentença.

Pela Lei nº 9.099/90 (Lei dos Juizados Especiais), caso o requerido seja devidamente intimado para a audiência de tentativa de conciliação e não compareça, aplica-se a pena de revelia. Isso significa que os fatos alegados pelo requerente serão presumidos verdadeiros, devendo o caso seguir para decisão a ser proferida pelo juiz competente. Caso o autor não compareça, o processo é extinto.

São penalidades muito graves, inseridas justamente para estimular o comparecimento às audiências de tentativa de conciliação e a composição de conflitos submetidos ao Judiciário. Entretanto, a situação gerada pela pandemia de covid-19 – em que pese o esforço da legislação em privilegiar a conciliação – criou um impasse pela necessidade de comparecimento das partes à audiência de conciliação.

Para resolver a situação, a Lei nº 13.994/20 traz uma importante inovação à Lei dos Juizados Especiais, estabelecendo expressamente o cabimento da “conciliação não presencial” com o uso dos recursos tecnológicos à disposição dos tribunais. O que se vê é um esforço para a manutenção da prestação jurisdicional em tempos de crise.

A alteração legislativa manteve ainda a aplicação da pena de revelia, caso o requerido não participe da sessão de conciliação virtual ou mesmo se recuse a participar. Ou seja, uma vez intimado, o requerido não tem a opção de informar seu desinteresse nessa modalidade de conciliação, exatamente como ocorre em relação à modalidade presencial.

Está, portanto, amplamente instituída nos juizados especiais brasileiros a conciliação virtual, o que demonstra o admirável movimento do Judiciário rumo à adoção de novas tecnologias em suas atividades, em especial no que diz respeito à tutela dos direitos dos cidadãos e ao estímulo à solução de conflitos pela via da composição.

O mundo atravessa uma crise sem precedentes. Ainda que dela decorram inúmeros infortúnios, é de certa forma esperançoso enxergá-la como oportunidade para a introdução de inovações tecnológicas no cotidiano da prestação jurisdicional.