Novidade trazida pelo Novo Código de Processo Civil (NCPC), o capítulo referente à ação de dissolução parcial de sociedade apresenta algumas controvérsias que nos propomos a analisar neste artigo, como se aponta, em síntese, a seguir.

I-         Dissolução parcial de sociedades anônimas

A primeira inovação do NCPC está em seu art. 599, que autoriza expressamente a ação dissolutiva parcial também para “sociedade anônima de capital fechado”, contanto que o acionista ou acionistas que detenham ao menos 5% do seu capital social demonstrem que ela “não pode preencher o seu fim” (§2º).  

Trata-se de novidade de índole material, na medida em que tanto o Código Civil quanto a Lei das S.A. previam somente a possibilidade de dissolução total da sociedade anônima, em consonância com o que antes determinavam o Código Comercial e o Código Civil de 1916.

O dispositivo já é alvo de críticas porque o diploma processual não se presta a dispor sobre o direito material, e essa inclusão foge à regra. Além disso, se uma sociedade não preenche seu fim, isso não se relacionaria apenas ao sócio dissidente, mas sim a todos. Por isso, a questão deveria ser tratada como uma hipótese de dissolução total, e não parcial, como previsto pela Lei das S.A. De todo modo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já teve a oportunidade de recentemente proferir julgado admitindo, por exemplo, a dissolução parcial de sociedade anônima que, em doze exercícios, somente gerou lucro em três e distribuiu dividendos em um deles. 

Enquanto o dispositivo recebe críticas por supostamente ir além do que deveria, ele também é alvo de insurgências por ter ido aquém do que poderia. Isso porque, há mais de uma década, a jurisprudência já admitia a possibilidade de dissolução parcial de determinadas sociedades anônimas com intuitu personae, privilegiando o conteúdo sobre a forma. São, por exemplo, as sociedades familiares, normalmente de pequeno ou médio porte, travestidas de S.A., porém com affectio societais muitas vezes evidente. Contudo, o NCPC silenciou nesse particular, tendo perdido a oportunidade de disciplinar uma hipótese que há muito já estava consolidada pela jurisprudência.

II -      Critério para apuração de haveres

O critério para apuração de haveres é, possivelmente, o ponto que mais interessa aos envolvidos em uma dissolução parcial de sociedade. Em consonância com o Código Civil e o Projeto do Código Comercial, o NCPC determinou que se observasse a previsão contida no contrato social. No entanto, apesar de expressa disposição nesse sentido, não raro a jurisprudência a flexibiliza sob o argumento de considerar determinada cláusula leonina, ou, ainda, por asseverar que o critério eleito no contrato social somente prevaleceria em caso de consenso.

Já em caso de omissão do contrato social, o NCPC estabeleceu que deve ser observado o critério patrimonial para apuração de haveres via balanço de determinação, que deve considerar não apenas ativos tangíveis como também os intangíveis. Trata-se de relevante modificação em relação à previsão do Código Civil, que apesar de estipular o critério patrimonial, silencia com relação à consideração dos bens incorpóreos.

No entanto, é importante alertar para uma tendência da jurisprudência de também flexibilizar a tal previsão. Embora grande parte dos julgados cumpra o previsto no NCPC, muitos asseveram que o critério patrimonial não poderia ser adotado isoladamente. Determinam, assim, que se observe o método do fluxo de caixa descontado após o balanço de determinação.

III -    Data da resolução da sociedade

Por fim, chama a atenção o inciso IV do art. 605 do NCPC, que estabelece como data da resolução da sociedade, na exclusão judicial de sócio, “a do trânsito em julgado da decisão que dissolver a sociedade”.

Não obstante o louvável esforço do legislador, a nova norma, na prática, traz mais malefícios do que benefícios. Infelizmente, condicionar a apuração de haveres ao trânsito em julgado não apenas abre espaço para a perpetuação do conflito como para a possibilidade de manipulação da melhor data para apuração de haveres por meio de sucessíveis recursos.

Diante disso, já é possível verificar uma flexibilização do dispositivo por parte da jurisprudência, até mesmo porque o art. 607 possibilita a revisão da data e do critério de apuração de haveres, desde que “a pedido da parte, a qualquer tempo antes do início da perícia”. Os tribunais estaduais, por exemplo, já fixaram a data da resolução quando da citação na ação  ou do envio de notificação que estampe a evidente quebra de affectio societatis. 

Como sintetizado acima, o NCPC andou bem ao disciplinar a ação de dissolução parcial de sociedade, lacuna sentida no diploma anterior. Todavia, o referido capítulo já nasceu alvo de polêmicas, pois trouxe inovações de índole material e deixou de positivar aspectos que, na prática, já contavam com uma definição. Assim é que, como acontecia antes, pode-se esperar que a jurisprudência fique com o papel de responder aos questionamentos sobre a matéria.