Passados aproximadamente 20 anos do primeiro programa de concessão de rodovias federais e do estado de São Paulo à iniciativa privada, os contratos de concessão então celebrados entre a administração pública e as empresas operadoras desses trechos se encerrarão em breve e há grande expectativa sobre que medidas serão tomadas em relação a eles.

O contexto na época em que essas rodovias foram concedidas era de instabilidade econômica, política e institucional e de redução do papel do Estado na gestão da infraestrutura pública, o que levou tanto o governo federal quanto o do estado de São Paulo a priorizar a delegação dos seus ativos mais rentáveis, as verdadeiras “joias da coroa”, com altas taxas internas de retorno (TIRs), compatíveis com a situação macroeconômica dos anos 1990.

Esse trabalho envolveu iniciativas em três dimensões: na política, a edição da Lei Federal nº 8.987/95 e da Lei Estadual nº 7.835/92; na econômica, a implantação do Plano Real e a redução da inflação e do risco Brasil; e na técnica, a estruturação e o acompanhamento de contratos complexos com que a Administração Pública brasileira tinha pouca familiaridade.

Atualmente, uma alternativa possível para a gestão dessa infraestrutura seria a prorrogação antecipada dos contratos de concessão de acordo com as regras previstas na Lei Federal nº 13.448/17 e na Lei Estadual nº 16.933/19. Nesse caso, e como premissa de política pública para a prorrogação antecipada, novos investimentos seriam incluídos nos contratos, que também deveriam se adequar às melhores práticas regulatórias atuais. Sem entrar no mérito da decisão de política pública, pelo que se observa até o momento, no entanto, ambos os governos têm optado por licitar novamente esses ativos, com a inclusão de novos trechos, em vez de prorrogar antecipadamente os contratos de concessão. A decisão gera novas oportunidades de negócio, além de estender a qualidade da infraestrutura rodoviária a outras regiões.

Entre os trechos de rodovia que integraram a primeira etapa do programa de concessões de rodovias federais (Procrofe), destacam-se os 346 km da BR-116/RJ/SP – Rodovia Presidente Dutra, que liga o Rio de Janeiro a São Paulo e cujo contrato de concessão se encerrará em março de 2021. O Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) estuda licitar novamente essa rodovia, mas com a inclusão do trecho de 23 km da BR-465/RJ e de outro de 266 km da BR-101/RJ/SP. Ou seja, considerando todos os investimentos já realizados no trecho da BR-166 atualmente concedido e seu alto volume de tráfego, o governo pretende desenvolver trechos rodoviários conexos cuja concessão isolada não teria viabilidade.

Além da Dutra, o trecho de 121 km da rodovia BR 290/RS, que representa uma importante ligação no estado do Rio Grande do Sul, havia sido concedido inicialmente à Concepa, controlada pelo Grupo Triunfo. No entanto, no início do ano passado, essa rodovia foi novamente licitada (à ViaSul, controlada pelo Grupo CCR), com a inclusão de trechos das rodovias BR-101, BR-448, e BR-386, o que ampliou os trechos para 472 km.

O estado de São Paulo tem seguido a mesma tendência. Um exemplo são os trechos de 74 km da rodovia SP-310, que interliga São Carlos a Cordeirópolis, e de 144 km da rodovia SP-225, que interliga Bauru a Itirapina, atualmente concedidos à Centrovias, controlada pelo Grupo Arteris. Em breve, haverá nova licitação para concessão dessas rodovias. Nela, serão incluídos trechos das rodovias SP-294, SP-425, SP-284, SP-331, SP-293, SP-261, SP-304, SP-197, SP-191 e SP-308, o que aumentará o total concedido para 1.201 km.

A decisão pela relicitação das rodovias com a inclusão de novos trechos precisa ser analisada com cuidado para justificar sua vantagem sobre a prorrogação de uma concessão existente. Os governos federal e estadual de São Paulo têm apresentado justificativa para a decisão de licitar, em primeiro lugar, porque já existe um histórico consolidado de dados técnicos sobre esses ativos (nível de tráfego e condições geológicas que possam afetar o pavimento, entre outras), o que reduz significativamente os riscos para os possíveis vencedores. Em segundo lugar, a inclusão de novos trechos pode contribuir para o desenvolvimento de outras regiões, o que, em certa medida, também beneficia a futura concessão com o possível aumento de tráfego.

Ao contrário da decisão de política pública adotada em outros modais logísticos – como ferrovias e portos, nos quais a tendência é pela prorrogação (antecipada ou não) dos contratos existentes – o setor rodoviário parece ter uma propensão para relicitar os contratos atuais. Isso, contudo, não impede que, em certos casos, a decisão do poder público seja diferente, permitindo a prorrogação de contratos existentes com base em justificativas que demonstrem sua vantagem sobre a relicitação.