A rápida expansão das redes sociais tem provocado debates importantes sobre consequências e limites da liberdade de expressão. Com a popularização do uso dos smartphones, redes como Facebook, Twitter, Instagram, WhatsApp, Snapchat e muitas outras surgem e crescem exponencialmente em todo mundo e também no Brasil. Pesquisas[1] apontam que cerca de 130 milhões de brasileiros eram usuários ativos de alguma rede social em 2017, colocando o país em quarto lugar no mundo, atrás apenas de China, Índia e Estados Unidos (e ao lado da Indonésia). As mesmas pesquisas[2] revelam que o Brasil é o terceiro país no mundo em número de usuários ativos no Facebook e o segundo em usuários ativos do Instagram.

Apesar de algumas restrições próprias na utilização de redes sociais, como o bloqueio de comentários racistas ou cenas indevidas, a facilidade de uso dessas ferramentas permite que os usuários expressem livremente seus pensamentos e opiniões sobre os mais diversos temas e das mais variadas formas. A distância presencial entre os integrantes das redes, no entanto, cria uma falsa sensação de proteção e leve as pessoas a manifestar de forma mais livre seus pensamentos e ideias. Fato é que esse uso muitas vezes impensado das redes sociais para opinar publicamente sobre aspectos relacionados ao próprio emprego pode causar impactos negativos nas relações de trabalho.

A CLT dispõe em seu artigo 482 sobre a possibilidade de demissão por justa causa de empregado que tenha praticado ato considerado lesivo à honra ou boa fama do empregador ou de superiores hierárquicos, cabendo ao empregador analisar essas manifestações para tomar as medidas cabíveis.

Nossos tribunais regionais do trabalho têm recebido cada vez mais reclamações trabalhistas contendo pedidos de declaração de nulidade de dispensas por justa causa decorrentes de supostos atos lesivos à honra do empregador praticados pelos empregados. Ao analisar as decisões proferidas, verifica-se que não há um posicionamento majoritário por parte dos tribunais do trabalho, cabendo aos juízes uma análise pormenorizada das provas e dos fatos apresentados pelas partes.

Para não correr o risco de que os tribunais do trabalho descaracterizem a demissão por justa causa, o empregador tem dois caminhos a seguir. O primeiro é a elaboração de um código de conduta ou de uma política de procedimentos a ser respeitada pelos empregados. Ela deve informar os limites do uso das redes sociais para questões relativas ao trabalho, requerendo do empregado confidencialidade sobre determinados assuntos, e destacar que o empregador não aceita a publicação de comentários nas redes sociais sobre as condições de trabalho, que exponham questões específicas do ambiente interno, nem comentários depreciativos sobre a empresa ou colegas de trabalho.

Na sequência, como segundo caminho, caberá ao empregador analisar a conduta do empregado da mesma forma que os próprios juízes do trabalho fariam, considerando que a dispensa por justa causa é uma pena máxima aplicada ao empregado, com consequências que marcarão toda a vida profissional dele. Caso o empregador adote essa medida sem provas robustas de que as postagens na rede social configuraram ato lesivo à reputação da empresa, a justa causa poderá ser revertida em juízo.

O empregador deverá, portanto, analisar a materialidade e a autoria da manifestação nas redes sociais para confirmar se o empregado é o autor das postagens que causam lesão à imagem da empresa ou, em caso negativo, se fez comentários que corroboraram as postagens lesivas. Os casos em que o empregado apenas “curte” a postagem de outros usuários, sem apresentar expressamente sua opinião contrária à empresa, têm acabado em reversão da justa causa na Justiça do Trabalho e na condenação do empregador ao pagamento das verbas rescisórias.

Outro ponto a ser analisado diz respeito à gravidade do ato praticado pelo empregado e a proporcionalidade da pena aplicada pelo empregador. Postagens em que não se verifica a lesão objetiva à honra do empregador podem levar à desconsideração da demissão por justa causa. Nesses casos, o empregador deve aplicar outras sanções administrativas ao empregado de forma proporcional à conduta adotada. Mensagens subliminares, portanto, não são suficientes para ensejar a aplicação da justa causa.

As demissões por justa causa com menor potencial de reversão quando contestadas pelo empregado na Justiça do Trabalho têm sido aquelas em que o empregado ataca diretamente a honra ou boa fama do empregador ou do seu superior hierárquico, com reclamações sobre condições de trabalho, associando-as com trabalho escravo, por exemplo, ou com palavras de baixo calão dirigidas contra a empresa ou contra superiores hierárquicos.

É importante verificar também a publicidade dada à manifestação do empregado. Em casos de postagens privadas, que ficam ocultas do público em geral, não restaria verificada a lesão à imagem ou boa fama do empregador. Por outro lado, a lesão é clara quando o empregado faz a postagem pública e a vincula a outros empregados ou empresas.

Por fim, o empregador deverá observar a imediatidade na aplicação da dispensa por justa causa, uma vez que a demora em punir é interpretada como perdão tácito e, consequentemente, como aceitação de que não houve danos ou lesão à honra ou imagem da empresa.

Em síntese, diante de mensagens possivelmente negativas veiculadas por seus empregados nas mais diversas redes sociais, o empregador deverá analisar detalhadamente se todos os elementos acima estão presentes, se a manifestação ultrapassa os limites da liberdade de expressão e se configura uma lesão ou ofensa à honra e boa fama da empresa.


1. We are Social e Hootsuite. “2018 Digital Yearbook”. https://www.slideshare.net/wearesocial/2018-digital-yearbook-86862930

2. We are Social e Hootsuite. “Digital in 2018”. https://wearesocial.com/blog/2018/01/global-digital-report-2018