Em 2013, pouco depois de terem vindo a público escândalos envolvendo a manipulação de taxas de câmbio e juros, a Iosco (International Organization of Securities Commissions) publicou um relatório em resposta a uma consulta sobre regras aplicáveis a financial benchmarks (referenciais financeiros). De modo não surpreendente, foram detectadas preocupações quanto à fragilidade de certos referenciais, sobretudo em termos de integridade e continuidade.

No Brasil, em operações cursadas nos mercados financeiro e de capitais, um dos parâmetros de remuneração (benchmarks) mais comumente adotados é a taxa DI. Ela serve como referencial para inúmeros empréstimos bancários (operações entre bancos e clientes), captações via debêntures, aplicações financeiras diversas (p. ex.: fundos DI), entre outras transações.

Em termos bem simples, a taxa (DI) utilizada em todas essas situações deriva da taxa de juros praticada em operações interbancárias. Mais especificamente, a taxa DI é calculada com base em empréstimos interbancários entre instituições não integrantes do mesmo conglomerado, com base em taxas pré-fixadas e com prazo de um dia.

Portanto, a determinação da taxa DI para uma data é sempre feita segundo certos procedimentos, por meio dos quais um universo de operações elegíveis é objeto de escrutínio. A metodologia utilizada manteve-se razoavelmente constante ao longo do tempo, embora tenha sofrido melhoramentos pontuais.

Ocorre que, há alguns anos, nota-se uma redução significativa na quantidade de operações cursadas no mercado interbancário. Em 2013, por exemplo, quando a taxa DI começou a apresentar grandes distanciamentos da taxa Selic (que tradicionalmente a acompanhava pari passu), essa situação foi reconhecida oficialmente pela primeira vez, e a Cetip (sucedida pela B3 – Brasil, Bolsa, Balcão S.A.) decidiu alterar sua metodologia de cálculo, de tal modo que, se num determinado dia houvesse menos de dez operações no mercado interbancário, adotava-se, para fins de apuração da taxa, a correlação histórica entre a taxa DI e a Selic.

Em 1º de outubro de 2018, seguindo as recomendações da Iosco (especialmente no que concerne à suficiência de dados para apuração do referencial, objeto do Princípio 7), a metodologia para apuração da taxa DI utilizada pela B3 passou a se basear na observação ou não de duas condições: (i) o número de operações elegíveis para o cálculo da taxa ser igual ou superior a 100; e (ii) o somatório dos volumes das operações elegíveis para o cálculo da taxa ser igual ou superior a R$ 30 bilhões. A nova regra, portanto, confere mais transparência e robustez ao referencial, que agora depende de duas variáveis: quantidade e volume das operações. Assim, se ao menos uma das duas condições acima não for observada em determinada data de apuração, a taxa DI divulgada será igual à taxa Selic Over.

Diante dessa mudança, talvez seja possível revisitar os fundamentos que levaram à edição da Súmula 176 do Superior Tribunal de Justiça, de 1996, que indica ser “...nula a cláusula contratual que sujeita o devedor à taxa de juros divulgada pela Anbid/Cetip”, em razão de tal taxa supostamente estar “...submetida ao arbítrio de uma das partes”. Isso porque, com a nova metodologia, é mais remoto – senão praticamente inexistente – o risco de a taxa DI sofrer manipulação.