Quando o Plano Diretor Estratégico de São Paulo (PDE) foi implantado por meio da Lei 16.050/14, já havia a exigência de o Poder Executivo encaminhar à Câmara Municipal, até o fim de 2021, um projeto de revisão intermediária do PDE contendo evidências analíticas do que foi eficaz e do que não atendeu plenamente às expectativas da legislação e, portanto, demandaria modificações.

Essa revisão, prevista no art. 4º da lei, não tem a intenção de alterar os objetivos principais e as bases legais estabelecidas, mas fazer um ajuste fino e específico em mecanismos que não produziram efeito como inicialmente esperado.

Apesar de o PDE de 2014 ter traçado objetivos de inovação, inclusão social, combate à desigualdade socioterritorial e requalificação dos espaços públicos, é fácil constatar que ainda persiste, e de forma latente na cidade, o grande adensamento de famílias nas regiões periféricas de São Paulo, além dos problemas de licenciamento e de alta irregularidade fundiária nessas áreas. Há também a dificuldade de trazer a população de baixa renda para as proximidades dos eixos de transporte, servidos de largas avenidas e de interligação com linhas de trem e metrô, ainda mais nesse período de pandemia.

Atendendo ao apelo de diversas entidades populares e do Ministério Público, a Prefeitura apresentou, durante a 66ª Reunião Ordinária do Conselho Municipal de Política Urbana (CMPU), realizada em 28 de outubro de 2021, o Projeto de Lei 742/21, que prorrogaria inicialmente o prazo de conclusão da revisão intermediária do PDE até 31 de dezembro de 2022. O intuito de deixar os ajustes ao PDE para um momento pós-pandemia é de, inclusive, assegurar uma série de requisitos ao processo de revisão, com especial atenção à garantia de participação da população carente e digitalmente excluída nas discussões presenciais sobre tema de tamanha complexidade.

Tramitado o projeto e aprovado na forma de substitutivo do Poder Legislativo, com modificações ao texto inicial após debates e audiência pública, a Câmara Municipal, em sessão de 14 de dezembro de 2021, decretou – e o prefeito promulgou – a Lei 17.725/21, que prorrogou o prazo para que o Poder Executivo encaminhe a proposta de revisão do PDE até 31 de julho de 2022.

A prorrogação levou em conta que o chamamento público e a interação com a sociedade civil são aspectos fundamentais para organizar e intensificar a participação pública no processo de revisão e ajudar a adequar o PDE aos anseios e necessidades da população. Essa participação pública vem sendo realizada desde maio de 2021 por meio de ações virtuais, como questionários, oficinas, enquetes e diretamente no site do Plano Diretor, mas a ideia é que possa ser efetivamente presencial.

Durante a revisão, será impossível deixar de considerar a influência da pandemia de covid-19 nos resultados do PDE no período entre a sua promulgação e os dias atuais. Isso porque diversos hábitos do cidadão paulistano foram alterados nesse momento de distanciamento social, com a reorganização do funcionamento da própria cidade, situações que não eram esperadas nem poderiam ter sido previstas, diante de um quadro de total atipicidade causado pela doença. Além disso, não se pode ignorar que, desde a entrada em vigor do PDE, o país vive um período de baixo crescimento econômico, com quedas sucessivas no Produto Interno Bruto (PIB).

A revisão do PDE nessas circunstâncias trouxe uma situação nova, que é a necessidade de repensar a cidade para a retomada do desenvolvimento econômico e social em um cenário pós-pandemia. São Paulo está se transformando de maneira diferente. É possível notar, por exemplo, a frequência cada vez maior de notícias de imóveis comerciais vagos devido ao fechamento de atividades empresariais ou ao alto custo de renovação dos contratos de locação.

Além disso, com a tendência de diversos setores da economia, especialmente bancos e empresas de tecnologia e investimentos, de adotar o trabalho remoto ou mesmo híbrido, muitos vêm priorizando momentaneamente o trabalho à distância, inclusive como forma de conter custos e despesas e evitar a propagação do vírus. Essa mudança de comportamento afeta diretamente um dos principais objetivos do PDE, o adensamento populacional nos eixos da cidade, cujo objetivo é o de aproximar a moradia do emprego.

Outro ponto a ser considerado no ajuste do PDE é o estímulo à verticalização nos eixos e regiões de maior infraestrutura, o qual conta com grande interesse do mercado imobiliário. A iniciativa, porém, enfrenta o problema da grande alta de preço e, por vezes, a resistência de grupos de moradores aos impactos do grande adensamento populacional.

Esse impulsionamento já vem transformando aos poucos as regiões da cidade com maior infraestrutura urbana e de acesso, as chamadas Zonas de Estruturação Urbana, mas, evidentemente, em ritmo e proporção abaixo do proposto pelo PDE. Diante da situação econômica e financeira mundial, o que se vê é a criação de unidades habitacionais cada vez menores e com preços ainda muito altos e juros em elevação, se comparados aos das periferias ou regiões fora dos eixos, o que impede o acesso direto de grande parte da população a esses imóveis.

Nesse cenário de grandes mudanças e incertezas sobre os rumos do adensamento e desenvolvimento da cidade de São Paulo, a prorrogação do prazo da revisão permite discutir mais profundamente o tema e implementar medidas efetivas para adaptar o PDE à realidade de crise econômica e social pós-pandemia.

Espera-se que o novo prazo de discussão seja suficiente para a Prefeitura enviar a proposta de revisão já contando com uma maior participação popular. Com o avanço da vacinação contra a covid-19, provavelmente será possível realizar debates e audiências de forma segura e participativa e obter contribuições para melhoria do processo e efetivo alcance dos objetivos da lei.