Passados poucos dias do anúncio da nova estratégia para o Complexo Industrial-Econômico de Saúde (Ceis) pelo governo (confira nosso material especial sobre o tema), o Tribunal de Contas da União (TCU) deliberou em sessão plenária que o Ministério da Saúde (MS) não celebre novas parcerias de desenvolvimento produtivo (PDPs) até que se adotem medidas para avaliação de transferências tecnológicas e critérios objetivos para seleção de parceiros privados.

A PDP é uma modalidade de parceria governamental que tem como objetivo estabelecer a cooperação entre laboratórios públicos e privados para desenvolvimento, capacitação e transferência de tecnologias consideradas estratégicas para o Sistema Único de Saúde (SUS).

De acordo com o MS, a regulação aplicável às PDPs está sendo revista e uma nova minuta deve ser colocada em consulta pública em breve.

Desde 2017, a Unidade de Auditoria Especializada em Saúde (AudSaúde) do TCU fiscaliza o andamento das 88 PDPs vigentes (85 para medicamentos e 3 para produtos para saúde). A unidade já havia emitido recomendações ao MS para que o marco regulatório aplicável às parcerias (Acórdão TCU 730/17) fosse aperfeiçoado.

No entanto, ao constatar a inércia do ministério, o órgão de controle publicou nova decisão (Acórdão TCU 2.015/23) com as seguintes determinações:

  • em até 60 dias, o MS deve compartilhar cronograma para definição e implementação dos critérios e as metodologias que deverão ser observados para apuração do valor de transferência de tecnologia (know how). Sobre esse tópico, o MS informou que o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) foi contratado para elaborar um estudo sobre o tema;
  • no mesmo prazo, os laboratórios públicos deverão ser informados sobre a necessidade de realizar um processo seletivo ou de pré-qualificação do parceiro privado, justificando adequadamente quando a sua realização for inviável;
  • em até 180 dias da publicação de novo ato normativo interministerial sobre as modalidades de parceria – PDPs, encomendas tecnológicas e medidas de compensação – o MS deve incluir a verificação de conformidade com os princípios de direito público entre os critérios para aprovação de PDPs – em particular os de publicidade, legalidade e moralidade. Uma minuta de ato normativo sobre o tema já está sendo feita em conjunto pelo MS, o Ministério da Economia (ME) e o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) ; e
  • no mesmo prazo deverá ser reformulado o marco regulatório das PDPs e os regimentos internos da Comissão Técnica de Avaliação (CTA) e do Comitê Deliberativo (CD), estabelecendo:
    • parâmetros objetivos para a análise de propostas de projetos e atribuição de notas às propostas;
    • critérios para a divisão de responsabilidades de laboratórios públicos – quando for aprovada mais de uma proposta de projeto de PDP para um mesmo produto; e
    • a necessidade de a CTA reanalisar propostas relativas a um mesmo medicamento e critérios de desempate e readequar percentuais de mercado.

Foi recomendado ao MS que não sejam celebradas novas PDPs até a definição de mecanismos objetivos para avaliar a conclusão e eficácia da transferência de tecnologias objeto de parceria. Também se recomendou ao ministério:

  • estabelecer objetivos para avaliação, definição e reavaliação periódica da lista de produtos estratégicos para o SUS elegíveis para a formalização das parcerias para o desenvolvimento produtivo. Além disso, futuros atos normativos deverão mencionar produtos que não são mais relevantes para o CIS e foram objeto de PDPs anteriores;
  • definir critérios para obtenção de preços de referência para as aquisições realizadas após a vigência da PDP, contemplando:
    • estudos que demonstrem o impacto econômico da transferência de tecnologia, bem como os benefícios alcançados com a PDP;
    • custo do insumo farmacêutico ativo (IFA) produzido no Brasil e comparativo com valores praticados no mercado internacional; e
    • necessidade de produção nacional do IFA.
  • incluir previsão da alteração nos percentuais de demanda previamente definidos para determinado produto, considerando os seguintes critérios:
    • avaliação da alteração nos percentuais de demanda definidos em processos seletivos de PDP anteriores precisa ser avaliada pela Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE/MS) e pela CTA e deliberada no âmbito do CD;
    • é preciso realizar uma avaliação conjunta e detalhada do impacto dos novos percentuais na previsão dos preços discriminados nos projetos anteriormente aprovados, já que os preços ali estabelecidos consideram não apenas os custos dos produtos fabricados, mas também o aporte tecnológico associado à internalização; e
    • sempre que a alteração das instituições públicas (IPs) contempladas no processo seletivo original se mostrar necessária, para atender aos princípios constitucionais de impessoalidade, moralidade, eficiência, isonomia e transparência, deve ser prevista a abertura de processo para seleção de novos projetos. Esse processo deverá seguir o rito ordinário, com ampla publicidade e possibilidade de participação de qualquer IP do Complexo Industrial da Saúde (CIS) que demonstre interesse na parceria. Além disso, nesses casos, quando ocorrer a publicação anual da lista de produtos estratégicos para o SUS, deve ser discriminado, entre aqueles que já foram objetos de PDP anteriores, os que, justificadamente, terão alterados os percentuais de demanda definidos originalmente.
  • estabelecer a necessidade de a SCTIE/MS avaliar cláusulas de contratos de tech transfer entre o laboratório público e o parceiro privado;
  • definir prazos para: atuação da equipe técnica da SCTIE/MS no âmbito da extinção de projetos; deliberações da CTA e do CD; análise de relatórios de acompanhamento; e realização de visitas técnicas;
  • estabelecer prazo máximo para inclusão das instalações do laboratório público no registro sanitário do produto e utilização de insumo farmacêutico produzido localmente; e
  • definir prazos, ritos e documentação padrão a ser utilizada para a comprovação da transferência tecnológica para o laboratório público.

Também foi indicado ao MS que seja ampliada a transparência dos atos relacionados às PDPs, com a divulgação de datas de suspensão, mudança de fase de cada parceria, composição do CD, histórico da composição da CTA e do CD, calendário, pauta e periodicidade das reuniões dos comitês de avaliação e deliberação das PDP.

Além disso, deverão ser apresentadas planilhas comparativas com o preço das aquisições de produtos estratégicos realizadas pelo MS. As planilhas devem contemplar, pelo menos, a última aquisição feita antes da vigência da PDP, todas as aquisições realizadas durante a sua vigência e as cinco primeiras aquisições realizadas após o término da fase de PDP.

A prática de Life Sciences & Saúde pode fornecer mais informações sobre o tema.