A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) divulgou, em 28 de fevereiro de 2023, o Ofício Circular Anual 2023 – CVM/SEP com as principais orientações sobre o cumprimento das obrigações de companhias abertas, estrangeiras e incentivadas com a autarquia.

Os ofícios anuais de orientação da Superintendência de Relações com Empresas (SEP) são ótimas referências para as companhias, pois facilitam o entendimento dos procedimentos a serem adotados em sua rotina de obrigações, além de trazerem informações sobre as interpretações do Colegiado da CVM e da própria SEP.

Destacamos a seguir alguns pontos do ofício.

  • Apresentação da DFP no âmbito do registro de companhia aberta

No item 2.10 do Ofício, a CVM esclareceu que não é preciso apresentar a DFP (Formulário de Demonstrações Financeiras Padronizadas) no âmbito do pedido de registro de emissor à CVM, quando forem apresentadas demonstrações financeiras para fins de registro, com data posterior ao último exercício social, seja em razão de alteração relevante das condições do emissor ou em razão de ele ter sido o emissor constituído ao longo do exercício social.

A CVM afirmou que, nesses casos, a DFP não é necessária para as demonstrações financeiras para fins de registro ou para as demonstrações financeiras do último exercício social.

  • Recurso contra aplicação de multa cominatória

Em relação ao item 2.16 do ofício, vale analisar o trecho abaixo:

“Nos termos do artigo 16 da Resolução CVM nº 47/21, conforme alterado pela Resolução CVM nº 159/22, da decisão de aplicação das multas cominatórias cabe recurso ao Colegiado da CVM ao superintendente da área, em segunda e última instância e sem efeito suspensivo, no prazo de 10 (dez) dias a contar da data de assinatura do AR do Ofício na sede da companhia. Apenas nos casos em que a multa cominatória for aplicada pela Superintendência Geral ou por membro do Colegiado que atue como Relator caberá recurso ao Colegiado. (grifo nosso)”

O trecho grifado acima não deve ser interpretado como possibilidade de que o recurso contra decisão de aplicação de multa cominatória seja endereçado, em qualquer caso, ao Colegiado da CVM. Essa possibilidade foi excluída pela modificação trazida pela Resolução CVM 159/22, e o pequeno trecho grifado nos parece mero erro, considerando as modificações da resolução mencionada.

O próprio texto do ofício confirma esse entendimento quando, em seguida, destaca corretamente que o Colegiado da CVM somente poderia ser acionado para esse recurso caso a penalidade fosse aplicada pela “Superintendência Geral ou por membro do Colegiado que atue como Relator”.

  • Demonstrações financeiras

Para as demonstrações financeiras, a CVM também trouxe algumas novas considerações, destacadas a seguir.

  • Divulgação da Demonstração do Valor Adicionado (DVA)

A CVM alertou que algumas companhias não têm apresentado o DVA em suas demonstrações financeiras, informações trimestrais e DFP, com todo o detalhamento exigido no Pronunciamento Técnico CPC nº 09, citando seus itens 15, 30 e 33, Modelos I, II e III. Recomenda-se que as companhias avaliem esse item em suas futuras informações financeiras, revisando-o com o apoio de seus assessores contábeis e auditores para atender à exigência regulamentar e evitar questionamentos futuros da autarquia.

  • Divulgação antecipada de informações financeiras

No item 3.2.2, a CVM trouxe nova recomendação para que as companhias que divulgam informações financeiras de forma antecipada adotem uma política de divulgação que preveja e estabeleça critérios para tais comunicações.

O ofício trata desse tema também no item 4.24 (Dados e métricas operacionais), ressaltando que, frequentemente, as companhias divulgam informações operacionais por meio de comunicados ao mercado, e não por fatos relevantes. Trata-se das conhecidas “prévias operacionais” e outras comunicações que evidenciam resultados antes da divulgação dos ITRs e demonstrações financeiras.

Considerando as recomendações expressas no ofício anual anterior e as novas considerações, seguem abaixo os itens a serem observados pelas companhias para esse tipo de comunicação:

  • A divulgação de informações financeiras de forma antecipada deve ser feita de forma excepcional.
  • Caso os dados financeiros sejam antecipados, em qualquer hipótese, a companhia deve fazê-lo de forma equitativa e ressaltar que as informações são preliminares, acrescentando se foram, ou não, auditadas ou revisadas pelos auditores independentes. Tais informações devem ser verdadeiras, completas, consistentes e não induzir os investidores a erro.
  • Essa informação deve, em regra, ser divulgada em fato relevante. No entendimento da SEP, informações das demonstrações financeiras são presumivelmente fatos relevantes.
  • Não há, no entanto, impedimento de que tais divulgações ocorram via comunicado ao mercado, desde que as informações divulgadas (i) não permitam inferir o resultado financeiro ou (ii) representem um múltiplo comumente utilizado para o valuation das companhias daquele setor. A administração deve avaliar a pertinência do fato relevante em cada divulgação.
  • Caso não se trate de divulgação excepcional, tendo a Companhia a prática de antecipar informações financeiras, é recomendável que adote uma política de divulgação que:

“(i) estabeleça quais os dados ou métricas que serão divulgados, contendo uma definição precisa do indicador, se necessário;

(ii) defina a periodicidade da divulgação (mensal, trimestral etc.);

(iii) fixe a data, ou período, para a referida divulgação (por exemplo, entre o 5º e o 7º dia útil de cada mês); e

(iv) determine que a divulgação seja feita com periodicidade regular, evitando assim a discricionariedade na divulgação”.

  • Na hipótese de alteração da política de divulgação que trate da antecipação de informações financeiras, a companhia deve divulgar previamente um fato relevante sobre a modificação.

Entendemos que, com essa interpretação, a CVM sinaliza que poderá avaliar de perto as prévias operacionais, e outras divulgações que possam antecipar informações dos resultados das companhias, sendo bastante recomendável que as companhias adotem as sugestões constantes do ofício.

  • Aquisição de sociedade – divulgação das informações

Em relação às comunicações sobre aquisições, já era recomendado que as companhias abertas divulgassem tais operações, com informações completas e que possibilitassem aos investidores uma análise do negócio realizado. Não há, portanto, uma alteração regulatória que motive a recomendação da CVM trazida no item 4.1.2 do ofício.

Nesse sentido, a recomendação para que as companhias divulguem fato relevante, ou comunicado ao mercado, contendo “informações relevantes disponíveis que permitam a compreensão do negócio pelo público a que se destina a informação, o que inclui as principais condições do negócio (preço, forma de pagamento etc.), além de informações financeiras (receita, EBITDA, lucro etc.) e/ou operacionais do negócio adquirido”, denota uma preocupação da autarquia com divulgações que não traziam informações suficientes sobre os negócios realizados.

Em suas novas divulgações sobre aquisições, portanto, as companhias devem buscar fornecer informações em linha com esse novo trecho do ofício.

  • Comunicação de transação com partes relacionadas

No item que trata da comunicação sobre transações entre partes relacionadas (4.16), a CVM trouxe nova recomendação, a título de “boa prática”. Embora não seja obrigatório, recomenda-se que a companhia divulgue a operação com parte relacionada nos termos do artigo 33, inciso XXXII, da Resolução CVM 80/22, no momento de sua aprovação pelos órgãos societários competentes, ainda que mencione suas condições para implementação da operação.

O prazo estabelecido pela Resolução CVM 80/22 continua sendo de sete dias úteis, contados da ocorrência da transação, nos termos do artigo 33, inciso XXXII, da resolução.

  • Conselho fiscal – substituição de membro suplente

Em seu tópico 7.1.4, o ofício evidencia a necessidade de realização de assembleia geral para eleger membro suplente do conselho fiscal, quando ocorrer a renúncia de algum membro. Essa exigência decorre do disposto na Lei das Sociedades por Ações, que em seu art. 161, parágrafo 1º, estabelece que o conselho fiscal deve contar com membros suplentes em igual número ao de membros efetivos.

Esse trecho do ofício demonstra a preocupação da CVM com os casos em que a substituição do membro suplente do conselho fiscal se prolonga, ficando a composição do órgão em desacordo com a disposição da Lei das Sociedades por Ações.

Embora a legislação não estabeleça prazo para a recomposição, o trecho sinaliza que a autarquia não permitirá que as companhias simplesmente aguardem uma nova assembleia, cuja data ainda não esteja prevista. Assim, é recomendável que as companhias convoquem tal assembleia no menor prazo possível.

Destaca-se ainda que, nos termos do art. 26, parágrafo primeiro, inciso II, alínea “a”, da Resolução CVM 81, a eleição de membro do conselho fiscal em companhias registradas na categoria A, e que possuam ações em circulação, demandará a apresentação do boletim de voto a distância pelas companhias.

  • Comunicação sobre encerramento dos programas de recompra

No tópico 7.14, a CVM recomendou que as companhias divulguem o encerramento dos seus programas de recompra, informando, no mínimo, a quantidade de ações adquiridas e qual a destinação pretendida para as ações recompradas.

  • Modificações introduzidas pela Lei 14.195/21

O ofício traz modificações decorrentes das importantes alterações promovidas pela Lei 14.195/21, dentre as quais destacam-se as relacionadas ao voto plural e à composição do conselho de administração, com a exigência de ocupação dos cargos por membros independentes, bem como com a vedação de cumulação de cargos para as posições de presidente do conselho e principal executivo da companhia.

Sobre tais temas, recomendamos a leitura do nosso e-book, além de artigo sobre as modificações trazidas pela Resolução CVM 168.

  • Novo Formulário de Referência

O ofício tem novas orientações sobre o preenchimento do Formulário de Referência, tema de grande interesse dos emissores, em razão das modificações constantes na Resolução CVM 80/22, com a redação dada pela Resolução CVM 59/21.

Além disso, o preenchimento do “Novo Formulário de Referência” ocorrerá na plataforma web da CVM, nos termos do Ofício Circular 7/2022-CVM/SEP, modificando o aspecto operacional de apresentação das informações.

Em breve, analisaremos neste portal as orientações da CVM para o preenchimento do novo Formulário de Referência.