A partir de 1º de agosto, será possível constituir os primeiros Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagros) com base na recém-editada Resolução CVM nº 39/21. Criado por meio da Lei nº 14.130/21, o Fiagro é um veículo de investimento coletivo direcionado ao financiamento privado do agronegócio, nos ativos listados a seguir:

  • imóveis rurais, que poderão ser arrendados ou alienados pelo fundo;
  • participações em sociedades que explorem atividades integrantes da cadeia produtiva agroindustrial;
  • ativos financeiros, títulos de crédito ou valores mobiliários emitidos por pessoas físicas e jurídicas que integrem a cadeia produtiva agroindustrial (incluindo a Cédula de Produto Rural (CPR), o Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio (CDCA), a Letra de Crédito do Agronegócio (LCA), o Certificado de Depósito Agropecuário (CDA), o Warrant Agropecuário (WA) e a Cédula Imobiliária Rural (CIR);
  • direitos creditórios do agronegócio e títulos de securitização emitidos com lastro em direitos creditórios do agronegócio, inclusive Cerificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs) e cotas de fundos de investimento em direitos creditórios (FIDCs) – padronizados e não padronizados – que apliquem mais de 50% de seu patrimônio nos direitos creditórios do agronegócio;
  • direitos creditórios imobiliários relativos a imóveis rurais e títulos de securitização emitidos com lastro nesses direitos creditórios, inclusive CRAs e cotas de FIDCs – padronizados e não padronizados – que apliquem mais de 50% de seu patrimônio nos direitos creditórios imobiliários; e
  • cotas de fundos de investimento que apliquem mais de 50% de seu patrimônio nos ativos listados acima.

Com a nova resolução da CVM – que tem competência normativa para regular a forma de constituição, funcionamento e administração dos fundos de investimento, nos termos do art. 1.368-C do Código Civil – dissiparam-se as dúvidas sobre se, a fim de abreviar o processo regulatório, a autarquia permitiria que os Fiagros usassem o regime da Instrução CVM nº 472, que disciplina o funcionamento dos fundos de investimento imobiliário.

A Resolução CVM nº 39/21 não criou uma disciplina específica para o Fiagro, mas, de forma mais célere e sem a abertura de audiência pública, admitiu que, a depender dos ativos que comporão a carteira do fundo, será possível usar a regulamentação existente aplicável a fundos de investimento em direitos creditórios, fundos de investimento imobiliário ou fundos de investimento em participações, o que se mostrar mais adequado. Ou seja, o administrador deve registrar os Fiagros na CVM em uma das três categorias indicadas a seguir:

  1. Fundo de investimento em direitos creditórios, que deverá incluir na sua denominação a expressão “FIAGRO – Direitos Creditórios”. Será aplicada a esses fundos a Instrução CVM nº 356 e não se admitirá seu registro na categoria de Fundo de Investimento em Direitos Creditórios – Não Padronizado, modalidade que a CVM está prestes a extinguir, conforme sinalizado na recente Audiência Pública SDM 08/20;
  1. Fundo de investimento imobiliário, que deverá incluir na sua denominação a expressão “FIAGRO – Imobiliário”. A Instrução CVM nº 472 será aplicada a esses fundos, que poderão investir também em Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) e Letras de Crédito do Agronegócio (LCA); ou
  1. Fundo de investimento em participações, que deverá incluir na sua denominação a expressão “FIAGRO – Participações” e estará submetido à Instrução CVM nº 578.

A CVM informou também que a regulamentação tem caráter temporário e experimental. Isso indica que a autarquia poderá editar norma especifica para disciplinar o Fiagro no futuro, aproveitando-se inclusive dessa experiência, a qual provavelmente contará com processo regulatório mais dilatado, com a participação do mercado em sede de audiência pública.

 

Incentivos fiscais do Fiagro podem ampliar crédito para o agronegócio

 

Criado em um cenário de crescente escassez de recursos públicos, que são atualmente a principal fonte de financiamento do agronegócio brasileiro, o Fiagro visa construir um canal para ampliação do fluxo de crédito privado no financiamento do setor produtivo nacional, inclusive permitindo a participação dos investidores de varejo. Dentre os atrativos fiscais do Fiagro, destacam-se:

  • isenção de IRRF para os rendimentos auferidos por Fiagro cujas cotas sejam negociadas em mercado de bolsa ou balcão e que sejam distribuídos para pessoas físicas, desde que o fundo tenha, pelo menos, 50 cotistas, sendo que a pessoa física usufrutuária do benefício não pode possuir (i) cotas que representem 10% ou mais da totalidade das cotas emitidas pelo Fiagro ou (ii) cotas lhe deem direito ao recebimento de rendimento superior a 10% do total de rendimentos auferidos pelo Fiagro;
  • diferimento para pagamento do imposto de renda oriundo do ganho de capital sobre as cotas integralizadas com imóvel rural por pessoa física ou jurídica para (i) a data da venda dessas cotas ou (ii) a data do resgate dessas cotas, no caso de liquidação do fundo. O pagamento do imposto diferido será proporcional à quantidade de cotas vendidas. Essa previsão é um grande estímulo para a integralização de cotas do Fiagro com imóveis rurais, permitindo a estruturação do fundo pelos proprietários rurais de forma menos onerosa, uma vez que não haverá necessidade de pagamento pelo cotista do ganho de capital no momento da integralização do imóvel (mas somente no momento da venda ou resgate das cotas); e
  • investimento em CDA, WA, CDCA, LCA, CRA e CPR, por meio da estrutura do Fiagro, com a mesma isenção de IRRF aplicável à pessoa física.

Além desses incentivos, a tributação dos ganhos e rendimentos do Fiagro pode ser postergada para o momento de amortização, resgate ou alienação das suas cotas, uma vez que, diferentemente dos FIIs, o Fiagro não está obrigado a distribuir aos cotistas o mínimo de 95% dos lucros auferidos, apurados segundo o regime de caixa, com base em balanço ou balancete semestral.

Sendo assim, logo veremos a criação dos primeiros Fiagros do Brasil, concretizando a ideia de transição do modelo de financiamento do agronegócio brasileiro que motivou a criação desse instrumento jurídico, além de permitir a utilização do fundo para planejamento patrimonial e sucessório, entre outras possibilidades que o mercado poderá explorar.

Para mais informações sobre as características do Fiagro, acesse nossos artigos: Fiagro: nova alternativa de financiamento privado para o agronegócio brasileiro e Fiagro: após derrubada de vetos no Congresso Nacional, agronegócio ganha mecanismo de financiamento com atratividade fiscal para investidores.