Neste artigo da nossa série sobre o Marco Regulatório Trabalhista Infralegal, abordamos os impactos sobre procedimentos de mediação de conflitos coletivos de trabalho no âmbito do Ministério do Trabalho e Previdência.

Além do ambiente complexo de regras trabalhistas legais e infralegais que desafiam as rotinas dos negócios no Brasil, existem as normas coletivas de trabalho. Em geral, elas são fruto da negociação entre sindicatos profissionais e empresas (representadas, por vezes, pelos seus sindicatos patronais) para compatibilizar interesses econômicos e sociais e regular as relações de trabalho nas empresas.

Na busca de um consenso entre as partes que negociam essas regras coletivas, ocorre por vezes um impasse que torna aparentemente inviável a comunicação entre as partes interessadas na resolução do conflito.

A Constituição Federal e a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prestigiam o instituto da negociação coletiva – que, por si só, é um mecanismo de solução de conflitos coletivos –, além de indicarem outros meios para a solução de impasses dessa natureza, como a via judicial e a arbitragem. Em ambos os casos, um terceiro decidirá a controvérsia.

Há quem diga que a intervenção de um terceiro no conflito – que vai impor sua decisão, obrigatoriamente, tanto na via jurisdicional como na arbitragem – nem sempre traz a melhor solução e pode desconsiderar certos interesses das partes e eventuais convergências entre empresas e empregados.

O mecanismo autocompositivo da mediação no direito coletivo do trabalho é uma das técnicas de superação do conflito e funciona de forma voluntária entre as partes. Esse tipo de recurso pode ser um aliado para ajudar empresas a superar divergências que impactem suas negociações coletivas. A busca pela solução, nesse caso, se dá com a participação de um mediador, ou seja, um intermediário que tem o papel principal de coordenar as tratativas para resolver o problema, levando em consideração as premissas e interesses dos envolvidos.

A mediação nos impasses em negociações coletivas de trabalho vinha sendo regulada pelo Decreto 1.572/95, que concedia às empresas e sindicatos a possibilidade de escolher, em comum acordo, um mediador para solucionar o conflito negocial ou solicitar ao Ministério do Trabalho a realização das conhecidas “mesas-redondas”, conduzidas por um mediador designado pelo próprio órgão e geralmente realizadas nas dependências das delegacias regionais do Trabalho.

O decreto de 1995, a nosso ver, limitava a utilização da mediação no âmbito do Ministério do Trabalho ao determinar que o mediador fosse convocado assim que frustrada a negociação direta “na respectiva data-base anual”. Isso poderia sugerir que outros conflitos coletivos ocorridos fora do contexto das reivindicações anuais dos acordos e convenções coletivas (ou seja, próximos às datas-bases das categorias negociantes) não estariam abarcados pela resolução via mediação.

Publicado em 11 de novembro de 2021, o Decreto 10.854/21, também conhecido como Marco Regulatório Trabalhista Infralegal, revogou as disposições do Decreto 1.572/95 e ampliou as diretrizes de utilização da mediação no âmbito do Ministério do Trabalho e Previdência (MTP) para os conflitos coletivos de natureza trabalhista em caráter geral, sem limitá-los aos impasses ocorridos nas negociações anuais em cada data-base.

No mesmo dia da publicação do decreto de 2021, o MTP publicou a Portaria 671/21, que, em sua Seção IV, regulamenta as disposições relativas à mediação de conflitos coletivos de natureza trabalhista.

Valendo-se de alternativas mais modernas na realização das mediações, o decreto e a portaria trouxeram às partes interessadas a possibilidade de utilizarem recursos tecnológicos de transmissão de sons e imagens em tempo real na realização de mediações “não presenciais”, evitando que os representantes de empresas e sindicatos tenham que se deslocar até o órgão regional do MTP para mediar e solucionar o conflito em reuniões presenciais.

Além disso, o Decreto 10.854/21 e a Portaria 671/21 promoveram as seguintes alterações em relação às mediações em conflitos coletivos:

  • Conferiram aos integrantes da carreira de auditor fiscal do Trabalho a presidência das mediações – ratificando o que já vinha ocorrendo na prática e ampliando a competência dos ocupantes desses cargos;
  • Centralizaram na figura dos servidores públicos o papel de intermediar o diálogo para compor os interesses das partes, de maneira gratuita;
  • Eliminaram a figura do mediador “credenciado”, o profissional cadastrado nos quadros do Ministério do Trabalho que poderia ser designado com a concordância das partes, as quais arcariam com os custos de seus honorários;
  • Removeram o prazo de 30 dias concedido ao mediador para encerrar a negociação coletiva mediada – ele poderia ser estendida apenas por acordo expresso entre as partes ou reduzido por solicitação do Delegado Regional do Trabalho; e
  • Determinaram que, nos casos em que a parte solicitante se ausente injustificadamente da mediação, o procedimento deverá ser arquivado, exceto se a outra parte solicitar a sua continuidade.

As mudanças apontam para uma flexibilidade maior na resolução do conflito coletivo ao desburocratizar procedimentos que tinham poucos efeitos práticos e facilitar a decisão das partes sobre como concluir as tratativas. As alterações na norma também acabaram com a cobrança de quaisquer pagamentos feitos por empresas e sindicatos pela participação do mediador, que, nos termos das novas diretrizes, será sempre um servidor público.

Estabelecido o consenso entre as partes, uma das principais alterações trazidas pelo decreto foi determinar que o mediador deverá lavrar uma ata que terá natureza de título executivo extrajudicial. Essa inovação buscou enquadrar a ata da mediação exitosa na hipótese de “escritura pública ou outro documento público assinado por devedor”, prevista no Código de Processo Civil.

A alteração confere força executiva, na Justiça do Trabalho, à ata de mediação em que as partes, com a intermediação e chancela do Ministério do Trabalho, firmarem uma solução para o conflito coletivo. Desse modo, a parte credora poderá satisfazer suas pretensões diante da parte devedora, promovendo a execução das obrigações estabelecidas na ata ou mesmo das multas impostas por descumprimento das estipulações lavradas. A avaliação atenta sobre os termos da ata e a possibilidade de sua execução garantirão maior segurança jurídica às empresas que busquem a mediação para solucionar conflitos coletivos de trabalho com os sindicatos.

Observa-se que as diretrizes trazidas pelo Decreto 10.854/21 aperfeiçoam as práticas relacionadas à mediação de conflitos coletivos de trabalho no âmbito do Ministério do Trabalho e Previdência. Com elas, as resoluções construídas entre as partes interessadas ganharão maior agilidade e eficácia.

Todas as alterações nas obrigações referentes à mediação de conflitos coletivos de trabalho passaram a vigorar em 11 de dezembro de 2021, 30 dias após a publicação do Decreto 10.854/21.

Nas próximas semanas, continuaremos a publicar artigos para explorar, de forma simples e prática, as principais alterações trazidas pelo decreto, portarias e instruções normativas, esclarecendo os principais impactos do marco regulatório para as empresas.