A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) regulamentou, em julho, a oferta pública de valores mobiliários em plataformas de crowdfunding (financiamento colaborativo). Resultado da Audiência Pública SDM 06/2016, a Instrução CVM nº 588/2017 dispõe sobre “a oferta pública de distribuição de valores mobiliários de emissão de sociedades empresárias de pequeno porte realizada com dispensa de registro por meio de plataforma eletrônica de investimento participativo”.

Além de representar uma grande disposição do regulador brasileiro do mercado de capitais para inovar, a norma proporciona mais segurança para as diversas partes envolvidas e, no longo prazo, deverá contribuir para o desenvolvimento desse tipo de mecanismo de captação de recursos.

As novas regras para o chamado equity crowdfunding e o investment crowdfunding no país excluem expressamente do seu âmbito de aplicação a atividade de empréstimos concedidos por pessoas físicas a pessoas físicas ou jurídicas, por meio da internet, sem a emissão de valores mobiliários (empréstimo peer-to-peer). No entanto, a norma não limitou o tipo de valor mobiliário a ser ofertado. Sendo assim, as sociedades empresárias de pequeno porte poderão emitir ações, debêntures e outros valores mobiliários, desde que juridicamente possível.

A sociedade empresária de pequeno porte precisa estar registrada no registro público competente e não registrada como emissora de valores mobiliários na CVM. Ela deve ter renda bruta anual não superior a R$ 10 milhões apurada no exercício social imediatamente anterior à oferta pública (ou valor proporcional quando tiver menos de 12 meses de operação). Caso a emissora seja controlada por outra pessoa jurídica ou fundo de investimento, o valor acima referido deverá ser apurado de forma consolidada.

A oferta pública deve ocorrer por meio de plataforma eletrônica regularmente constituída no Brasil e registrada na CVM. A plataforma será a entidade responsável por verificar o cumprimento dos requisitos da Instrução CVM nº 588 pela emissora e pela oferta.

Acatando pleitos dos agentes do mercado, a CVM estabeleceu 180 dias como prazo máximo de captação via plataforma. Esse é o prazo previsto, por exemplo, para as ofertas públicas com esforços restritos de distribuição. A minuta de norma colocada em audiência pública previa 90 dias, mas o prazo foi alongado com o objetivo de mitigar o risco de insucesso desse tipo de oferta, que pode vir a depender de um período mais longo para atingir os objetivos de captação da emissora.

As ofertas são destinadas a qualquer investidor, desde que observado o limite de investimento de R$ 10 mil por ano-calendário em valores mobiliários ofertados sob o regime da instrução. As exceções são o investidor líder da oferta (espécie de investidor-anjo com experiência prévia reconhecida pela plataforma), o investidor qualificado (conforme regulamentação vigente) e o investidor que tenha renda bruta anual ou montante de investimentos financeiros acima de R$ 100 mil. Neste último caso, o limite anual de investimento pode ser ampliado em até 10% do maior desses dois valores, por ano-calendário.

Após a manifestação de interesse do investidor em participar da oferta pública na plataforma, deve ser garantido prazo mínimo de sete dias para desistência, sem a aplicação de quaisquer multas ou penalidades.

As plataformas podem admitir em seu ambiente eletrônico o agrupamento de investidores apoiadores de um investidor líder no chamado “sindicato de investimento participativo”. É aceita a constituição de veículo de investimento para o sindicato, desde que cada veículo participe apenas de uma oferta pública e que não exponha os investidores apoiadores a riscos adicionais àqueles que incorreriam se investissem individualmente na mesma oferta pública.

O valor máximo de captação para a oferta pública será de R$ 5 milhões, limite que também deve ser observado para o conjunto de ofertas públicas realizadas pela mesma emissora com base na Instrução CVM nº 588 dentro de um mesmo ano-calendário. É possível fazer a distribuição parcial da oferta, desde que o ofertante estabeleça os valores alvo mínimo e máximo de captação (o mínimo deve ser igual ou superior a 2/3 do máximo).

Encerrada a oferta pública, a plataforma terá cinco dias úteis para providenciar a transferência do montante total captado à emissora ou para devolver os valores aos investidores, caso a oferta não tenha conseguido atingir o valor alvo mínimo de captação.

Embora a regulamentação do equity crowdfunding pela CVM seja uma novidade e tenha trazido uma série de novos elementos e requisitos para quem pretende utilizar tal regime de distribuição pública de valores mobiliários, esse tipo de investimento já vinha ocorrendo no Brasil há aproximadamente três anos com considerável nível de maturidade. A primeira oferta de equity crowdfunding no país foi realizada em junho de 2014, por meio da plataforma Broota, com o objetivo de captar recursos para financiar o início das atividades da própria plataforma. A operação foi estruturada pela Broota e contou com a assessoria jurídica do Machado Meyer.