Neste artigo da nossa série sobre o Marco Regulatório Trabalhista Infralegal, abordamos algumas das novas regras instituídas pelo Decreto 10.854/21 e pela Portaria 671/21 do Ministério do Trabalho e Previdência (MTP). No caso do decreto, analisamos mais especificamente o capítulo XVI, que trata do repouso semanal remunerado e do pagamento de salário nos feriados civis e religiosos, nos termos da Lei 605/49.

Publicada em janeiro de 1949, a Lei 605/49 previa que todo empregado tem direito ao repouso semanal remunerado de 24 horas consecutivas, preferencialmente aos domingos e, nos limites das exigências técnicas das empresas, nos feriados civis e religiosos, de acordo com a tradição local. Nesse aspecto, o dispositivo legal não sofreu nenhuma alteração, sendo seu teor integralmente reproduzido no artigo 152 do Decreto 10.854/21.

Mas o parágrafo único do artigo 153 introduz uma novidade sobre o tema, ao prever expressamente que também será obrigatório o repouso remunerado nos dias de feriados locais – até o limite máximo de quatro feriados – desde que a data seja reconhecida por lei municipal. Essa previsão inexistia na norma anterior.

O novo decreto assegura, como já fazia a Lei 605/49, que poderá haver trabalho no dia destinado ao repouso, desde que as empresas comprovem a exigência técnica e garantam a remuneração correspondente (remuneração em dobro, a não ser que concedida outra folga substitutiva pelo empregador).

A segunda novidade relevante trazida pelo Decreto 10.854/21 é a alteração da redação que define o que são exigências técnicas para fins da prestação de serviços nos feriados civis e religiosos. De acordo com o parágrafo 1º do artigo 154, “constituem exigências técnicas aquelas que, em razão do interesse público ou das condições peculiares às atividades da empresa ou ao local onde estas atuem, tornem indispensável a continuidade do trabalho, em todos ou alguns de seus serviços”. A grande novidade em relação à Lei 605/49 foi o acréscimo da expressão “em todos ou alguns de seus serviços”, para que não pairem dúvidas de que é possível haver trabalho nos dias de feriados civis e religiosos, mesmo que seja para atender apenas parte dos serviços da empresa.

Outra novidade importante foi a criação da escala de revezamento para os serviços que exigem trabalho aos domingos, exceto elencos teatrais e congêneres. A escala precisa ser organizada mensalmente e deve ficar exposta em quadro sujeito à fiscalização. Também se estabeleceu a possibilidade de o ministro do Trabalho e Previdência conceder, em caráter permanente, permissão para que as atividades que se enquadrarem nas exigências técnicas possam ser exercidas nos dias de repouso.

O decreto trouxe ainda a previsão de trabalho excepcional nos dias destinados ao repouso, por motivo de força maior ou para atender à realização ou à conclusão de serviços inadiáveis ou cuja não execução possa acarretar prejuízo. É necessário, porém, que a empresa obtenha autorização prévia da autoridade competente em matéria de trabalho, com a discriminação do período autorizado, que não poderá exceder a 60 dias por vez.

Nos dias de repouso em que for permitido o trabalho, as empresas não poderão executar serviços que não se enquadrem nos motivos determinantes da permissão, conforme estipula o artigo 156. Ou seja, havendo razoável motivo que justifique o trabalho no dia destinado ao repouso, o desempenho das atividades deve estar exclusivamente atrelado ao motivo que levou à excepcionalidade da medida, não podendo haver desempenho de atividades diversas.

Quanto ao critério de remuneração do repouso semanal, ele permanece exatamente com a mesma redação da Lei 605/49, fazendo distinção entre os empregados que trabalham por dia; semana; quinzena ou mês; hora; tarefa ou peça; ou em domicílio.

O decreto inovou ao prever que a ausência no serviço por punição disciplinar não pode ser justificada. Caso o empregado se ausente por esse motivo não cumprindo integralmente seu horário de trabalho, perderá o direito ao repouso semanal.

Já os motivos de falta justificável que não prejudicam o direito ao recebimento do repouso semanal permaneceram os mesmos em relação ao que previa a Lei 605/49, observadas as faltas justificáveis contidas no artigo 473 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Ainda em relação ao dia de repouso, o decreto esclareceu que:

  • as ausências decorrentes de férias não prejudicarão a frequência exigida para usufruir desse direito;
  • a remuneração do repouso semanal e a do feriado civil ou religioso que recaírem no mesmo dia não poderão ser acumuladas; e
  • o marco semanal para pagamento do repouso é o período de segunda-feira a domingo que antecede o dia determinado como repouso semanal remunerado.

Publicada no Diário Oficial da União na mesma data (11/11/2021) que o Decreto 10.854/21, a Portaria MTP 671/21 trata do trabalho aos domingos e feriados. Ela altera as regras infralegais referentes às autorizações permanentes e transitórias, concedidas às empresas, para trabalho nos dias de repouso.

No capítulo V, seção I, o artigo 56 estabelece que a autorização transitória para trabalho aos domingos e feriados civis e religiosos – nos termos do artigo 68 da CLT – passará a seguir os procedimentos dispostos pela portaria.

A autorização poderá ser concedida em duas hipóteses:

  • para atender à realização ou conclusão de serviços inadiáveis ou necessidade imperiosa de serviço; e
  • quando a inexecução das atividades puder acarretar prejuízo manifesto.

A grande alteração está no artigo 57. Nele se prevê que “a autorização de que trata o art. 56 será concedida pelo chefe da unidade descentralizada da Inspeção do Trabalho, com circunscrição no local da prestação de serviço, mediante fundamentação técnica que leve à conclusão pela realização ou conclusão de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa acarretar prejuízo manifesto à requerente”.

A novidade trazida por esse artigo consiste na revogação da Portaria 945/15 do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), segundo a qual, a autorização transitória também poderia ser feita por acordo coletivo específico firmado entre empregadores e entidade representativa da categoria profissional de empregados. Ou seja, pelo novo dispositivo, não será mais possível obter autorização transitória para trabalho aos domingos e feriados civis e religiosos via acordo coletivo de trabalho, mas somente por meio do chefe da unidade descentralizada da Inspeção do Trabalho.

O artigo 58 da Portaria 671/21 simplificou os documentos a serem apresentados para solicitação da autorização transitória. Bastará um laudo técnico fundamentado, com indicação da necessidade de ordem técnica e dos setores que exigem a continuidade do trabalho.

Alguns temas bastante discutidos na jurisprudência foram expressamente previstos pela portaria, entre eles:

  • nos serviços que exigem trabalho aos domingos, com exceção quanto aos elencos teatrais, é necessário o estabelecimento de escala de revezamento, mensalmente organizada e sujeita à fiscalização;
  • o repouso semanal remunerado deverá obrigatoriamente coincidir, pelo menos uma vez no período máximo de sete semanas, com o domingo, respeitadas as demais normas de proteção ao trabalho; e
  • nas atividades do comércio em geral, o repouso semanal remunerado deverá coincidir, pelo menos uma vez no período máximo de três semanas, com o domingo, respeitadas as demais normas de proteção ao trabalho e outras a serem estipuladas em negociação coletiva, nos termos da Lei 10.101/20.

Essas previsões aplicam-se tanto para a autorização transitória quanto para a autorização permanente de trabalho nos domingos e feriados. A escala de revezamento mencionada será livremente estipulada pelo empregador.

Conforme o artigo 59, a autorização transitória poderá ser cancelada em caso de:

  • descumprimento das exigências constantes na portaria;
  • infração nos atributos de jornada e descanso constatada pela Inspeção do Trabalho;
  • situação de grave e iminente risco à segurança e saúde do trabalhador constatada pela Inspeção do Trabalho.

O cancelamento só poderá ser feito mediante despacho fundamentado e baseado em relatório da Inspeção do Trabalho e após a empresa ter sido ouvida.

A portaria prevê ainda a concessão de autorização permanente para trabalho aos domingos e feriados, nos termos dos artigos 68 e 70 da CLT, para as empresas de laticínios, frio industrial, fabricação e distribuição de gelo, excluídos, em todos esses casos, os serviços de escritório.

Nas próximas semanas, continuaremos a publicar artigos para explorar, de forma simples e prática, as principais alterações trazidas pelo decreto e pelas portarias e instruções normativas, esclarecendo os principais impactos para as empresas.

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