Com o objetivo de assegurar a solidez, a estabilidade e o regular funcionamento do Sistema Financeiro Nacional, o Conselho Monetário Nacional (CMN) emitiu em 7 de abril a Resolução n° 4.797/20, estabelecendo até 30 de setembro deste ano, entre outras questões, vedações ao aumento da remuneração de diretores, administradores e membros do conselho de administração de instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil (Bacen).

No entanto, em razão de diversos questionamentos sobre a sua implementação, o CMN editou, em 29 de maio, a Resolução CMN n° 4.820/20, que revogou a Resolução CMN nº 4.797/20, reestabeleceu as vedações determinadas e as estendeu até 31 de dezembro, promovendo aperfeiçoamentos de redação e esclarecimentos.

Quanto à vedação ao aumento da remuneração, a nova resolução estabeleceu que:

  • é vedado às instituições financeiras aumentar a remuneração, fixa ou variável, inclusive sob a forma de antecipação, de diretores, administradores e membros do conselho de administração e do conselho fiscal;
  • os montantes sujeitos a essa vedação não podem ser objeto de obrigação de desembolso futuro;
  • o conceito de remuneração variável inclui bônus, participação nos lucros, parcelas de remuneração diferidas e outros incentivos remuneratórios associados ao desempenho;
  • a remuneração variável não poderá ser superior, nem em valores nominais nem em percentual, à remuneração paga no mesmo período do exercício anterior; e
  • os aumentos de remuneração, fixa ou variável, cujos procedimentos para concessão tenham sido concluídos antes de 7 de abril de 2020 não estão sujeitos a essa vedação.

O alcance e os limites da resolução geraram diversas dúvidas e debates entre as instituições ao longo dos últimos meses. Para elucidá-las, o Bacen publicou recentemente respostas a perguntas frequentes sobre a norma (FAQ), esclarecendo, entre outros pontos, que a vedação ao aumento de remuneração compreende também o simples reajuste em decorrência de reposição inflacionária ou por dissídio, ainda que previsto genericamente em política de remuneração da instituição ou definido em acordos ou convenções coletivas.

Desde então, muito se discute sobre como compatibilizar as vedações impostas pelo CMN, conforme esclarecidas pelo FAQ, com as demais obrigações legais decorrentes das negociações coletivas relacionadas ao reajuste salários dos empregados das instituições financeiras sujeitas à supervisão do Bacen, aplicável, inclusive, a diretores e administradores contratados com vínculo de emprego.

Poderia o CMN restringir a aplicação de reajustes salariais estabelecidos em dissídio ou definidos em acordos ou convenções coletivas?

O reajuste salarial na data-base anual, conforme estabelecido em convenção ou acordo coletivo de trabalho mediante livre negociação coletiva entre os sindicatos representativos de categoriais profissionais e econômicas, é previsto em lei[1] e constitui direito assegurado pela Constituição Federal aos empregados, em razão do reconhecimento da validade e do caráter normativo das convenções e acordos coletivos de trabalho.[2]

Nesse contexto, o descumprimento de obrigações estabelecidas em acordos ou convenções coletivas expõe as instituições a reclamações trabalhistas e ações coletivas por parte dos sindicatos representativos dos seus empregados, que podem requerer não só o pagamento de diferenças salariais decorrentes da não aplicação do reajuste salarial anual, devidamente corrigidas monetariamente e acrescidas de juros, mas também multas normativas e até mesmo eventual rescisão indireta dos contratos de trabalho.

Por outro lado, o descumprimento das restrições impostas pela Resolução CMN n° 4.820/20 expõe as instituições sujeitas à supervisão do Bacen às penalidades e medidas previstas na Lei nº 13.506/17.

Tendo em vista essa situação, caso as vedações estabelecidas pelo CMN permaneçam vigentes na forma atual, associações e sindicatos que representam as instituições sujeitas à supervisão do Bacen deveriam negociar com os sindicatos dos seus empregados reajustes salariais para diretores e administradores contratados com vínculo de emprego que sejam compatíveis com as vedações da resolução.

Entre os possíveis caminhos a serem adotados por meio de negociação coletiva para a aplicação das restrições impostas, vislumbramos:

  • postergação da negociação do reajuste salarial para esse grupo de empregados para um período posterior a 31 de dezembro de 2020; ou
  • o estabelecimento de permissão para as instituições negociarem individualmente com esse grupo de empregados o seu reajuste salarial após 31 de dezembro de 2020.

Por ora, entretanto, resta apenas aguardar os desdobramentos sobre o tema.


[1] Artigo 10 da Lei nº 10.192/2001: Os salários e as demais condições referentes ao trabalho continuam a ser fixados e revistos, na respectiva data-base anual, por intermédio da livre negociação coletiva.

[2] Interpretação dos artigos 8, XXVI, da Constituição Federal, e 611 da Consolidação das Leis do Trabalho.