A prática eletrônica dos atos processuais vem sendo constantemente privilegiada pelo ordenamento jurídico não apenas para adequar o processo às inovações tecnológicas vivenciadas pela sociedade, como para torná-lo instrumento capaz de assegurar provimento jurisdicional justo e satisfativo, no menor tempo possível.

O fenômeno teve início, ainda de forma incipiente, em 26 de maio de 1999, com a publicação da Lei 9.800/99, mais conhecida como “Lei do Fax”. Essa norma permitiu – de forma inovadora para a época – a utilização de sistema de transmissão de dados e imagens tipo fac-símile ou outro similar para a prática de atos processuais.

Pouco tempo depois, foi editada a Lei 10.259/01, conhecida como “Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais Federais”, que estabeleceu, pela primeira vez, a possibilidade de os tribunais organizarem serviços de intimação das partes e de recepção de petições por meio eletrônico.

A fim de aumentar a segurança da prática eletrônica dos atos processuais no âmbito dos juizados especiais, o presidente Fernando Henrique Cardoso editou a Medida Provisória 2.200/01, responsável por criar a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira (ICP-Brasil). Esse sistema tinha o objetivo de “garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações habilitadas que utilizem certificados digitais, bem como a realização de transações eletrônicas seguras”, conforme consta na medida provisória.

Dada a grande repercussão das normas em questão, foram publicadas diversas leis que alteraram o Código de Processo Civil de 1973 (CPC/73), para admitir a prática de atos processuais de forma eletrônica. Foi o caso da Lei 11.280/06, que estabeleceu a possibilidade de os tribunais disciplinarem a prática e comunicação de atos processuais eletrônicos, e da Lei 11.341/06, que autorizou a apresentação de prova da divergência jurisprudencial para fins de cabimento de recurso especial por mídia eletrônica.

Nesse contexto de crescente evolução tecnológica processual foi publicada a Lei 11.419/06, mais conhecida como “Lei do Processo Eletrônico”.

Esse diploma normativo trouxe várias inovações para o CPC/73, além de ter regulamentado a prática de diversos atos processuais de forma eletrônica, como o peticionamento inicial e intercorrente. Também autorizou que os órgãos do Poder Judiciário desenvolvessem sistemas eletrônicos de processamento e gestão de ações judiciais por meio de autos totalmente ou parcialmente digitais, o que levou à criação de diversas plataformas digitais, como PJE, e-proc, e-saj, projudi, entre outras.

Com a publicação da Lei 13.105/15, entrou em vigor o atual Código de Processo Civil (CPC/15), que privilegiou de forma ainda mais contundente a prática eletrônica dos atos processuais, ao prever, pela primeira vez, a obrigatoriedade de a Administração Pública (direta e indireta) e as empresas públicas e privadas manterem atualizado seu cadastro nos sistemas de processos digitais para fins de recebimento de citações e intimações de forma eletrônica (arts. 246, 1.050 e 1.051, CPC/15).

A pretexto de regulamentar esse cadastro, foi editada a Resolução do Conselho Nacional de Justiça 236 (Resolução CNJ 236/16), que instituiu a Plataforma de Comunicações Processuais (Domicílio Eletrônico), entre outros procedimentos. Dada a pouca profundidade da regulamentação, porém, essa sistemática acabou não sendo adotada nos processos judiciais imediatamente.

Depois disso, foi editada a Lei 14.195/21, que alterou diversos dispositivos do CPC/15, sobretudo no que diz respeito à comunicação dos atos processuais. Essa norma estabeleceu, entre outros pontos, que a citação será efetuada preferencialmente de forma eletrônica, reforçando-se a obrigatoriedade do cadastro das partes para fins de recebimento de citações e intimações, alçando esse registro à categoria de dever processual (arts. 77, VII, 246, caput, CPC/15).

Estabeleceu-se também que, caso a citação eletrônica não seja recepcionada pelo réu no prazo de três dias úteis, ele deverá apresentar nos autos, na primeira oportunidade, justa causa para não ter recebido a citação, sob pena de responder por ato atentatório à Justiça, passível de multa de até 5% do valor da causa (art. 246, caput, §§ 1º-B e 1º-C, CPC/15).

Com isso, novamente com o objetivo de regulamentar o cadastro das partes nos sistemas de processos eletrônicos, foi editada a Resolução CNJ 455/22. Essa resolução instituiu o Portal de Serviços do Poder Judiciário e regulamentou a realização de citações e intimações via Domicílio Judicial Eletrônico e Diário de Justiça Eletrônico Nacional (DJEN) – esse último já utilizado regularmente pelos tribunais federais.

De acordo com a Resolução CNJ 455/22, o Portal de Serviços do Poder Judiciário, plataforma digital de acesso aos usuários externos, permitirá a consulta unificada de todos os processos eletrônicos em tramitação, o peticionamento eletrônico e o acesso às citações e intimações recebidas tanto via Domicílio Judicial Eletrônico quanto via DJEN. O sistema promete uniformizar as diversas plataformas digitais operadas pelos tribunais, conferindo maior segurança aos usuários.

O Domicílio Judicial Eletrônico, por sua vez, permitirá que as partes recebam as citações e intimações de forma eletrônica, seja por e-mail ou outro meio de comunicação digital pelo qual venham a optar, como SMS ou aplicativos de mensagens instantâneas (por exemplo, WhatsApp), unificando o canal de comunicação entre o jurisdicionado e o Poder Judiciário.

É importante reforçar que o cadastro é obrigatório para a Administração Pública (direta e indireta) e para as empresas públicas e privadas, que deverão se cadastrar no prazo de 90 dias a contar da data da implementação do Domicílio Judicial Eletrônico, conforme estabelecido expressamente pela Resolução CNJ 455/22. Essa exigência não é imposta às pessoas físicas, às microempresas e às empresas de pequeno porte que têm endereço eletrônico cadastrado no sistema integrado da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (Redesim).

Sem o cadastro, o interessado estará sujeito a sanções processuais, que vão desde uma possível imposição de multa em caso de não confirmação do recebimento de citação eletrônica no prazo estabelecido até a perda do prazo para resposta à intimação. Também estará submetido às consequências legais associadas à sua inércia (art. 246, caput, §§ 1º-B e 1º-C, CPC/15 e art. 20, §§ 3º e 4º, Resolução CNJ 455/22).

Após a Resolução CNJ 455/22, em 09 de fevereiro de 2023, foi editada a Portaria CNJ 29/23, que definiu o prazo de 90 (noventa) dias para os Tribunais, com exceção do STF, implementarem o domicílio judicial eletrônico e as instituições financeiras, vinculadas à FEBRABAN, realizarem o cadastro no domicílio judicial eletrônico.

O prazo em questão foi prorrogado por mais 90 (noventa) dias pela Portaria CNJ 129/23, de modo que os Tribunais e as instituições financeiras terão até o dia 15 de agosto de 2023 para adotarem as medidas determinadas na Portaria CNJ 29/23.

Até o momento, tem-se notícia de que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região e os Tribunais de Justiça do Mato Grosso, Rio Grande do Sul, Paraíba, Pará, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Santa Catarina e Distrito Federal já deram início a utilização do domicílio judicial eletrônico para envio de comunicações processuais aos bancos e instituições financeiras.

É fundamental que as demais pessoas jurídicas se atentem à divulgação do novo cronograma pelo CNJ para cadastro na referida plataforma eletrônica. Estamos à disposição para auxiliá-los com essa nova medida.